O Assédio Moral e a Legislação Brasileira

Tema de grande relevância e amplamente discutido nos Tribunais pelo país é o assédio moral. Ele nada mais é do que qualquer conduta praticada reiteradamente pelo empregador ou por empregado em face de subordinado ou colega de trabalho, com o intuito de atacar a dignidade do trabalhador ou seus direitos, sua higidez física ou mental. É também qualquer outro ato capaz de comprometer sua carreira profissional ou que degrade o ambiente de trabalho.

Trazendo para o plano concreto, estas condutas são aquelas frequentemente observadas em grande parte das empresas como, por exemplo, a humilhação constante de colega de trabalho.

O tema é tão relevante que a Organização Internacional do Trabalho realizou estudos na União Européia e concluiu que pelo menos 9% dos trabalhadores do mencionado bloco sofrem com tratamento tirânico de seus patrões.

Ocorre que até o presente momento o tema assédio moral não foi regulamentado pela legislação brasileira. Apesar de não impedir a condenação judicial de quem o pratica, tal fato é bastante prejudicial, eis que não existem critérios definidos sobre sua caracterização e, sobretudo, a respeito de suas conseqüências. Na prática a doutrina vem se encarregando desta tarefa estabelecendo seu conceito, sendo a reparação pecuniária garantida pelo Poder Judiciário.

Diversos projetos de lei tramitam no Congresso Nacional sem que se chegue à necessária regulamentação em âmbito federal.

Entretanto, em 16 de junho de 2009 a Medida Provisória n. 453/08 foi convertida na Lei n. 11.948/09, que versa sobre a constituição de fonte adicional de recursos para ampliação de limites operacionais do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e dá outras providências. Dentre estas, nota-se a disposição contida no seu art. 4º, que veda “a concessão ou renovação de quaisquer empréstimos ou financiamentos pelo BNDES a empresas da iniciativa privada cujos dirigentes sejam condenados por assédio moral ou sexual, racismo, trabalho infantil, trabalho escravo ou crime contra o meio ambiente”.

Apesar da citada Lei não se referir propriamente ao assédio moral, em uma primeira análise parece louvável a restrição prevista para os casos de condenação de dirigentes de empresas privadas por assédio moral.

Entretanto, vislumbra-se problema na referida previsão legal. A regra prevê a restrição ou vedação de empréstimo financeiro concedido pelo BNDES nos casos em que os dirigentes de empresas privadas forem condenados por assédio moral. Ocorre que no âmbito trabalhista este fato raramente ou nunca se concretiza, pois o empregado vítima do assédio moral aciona somente a empresa junto ao Poder Judiciário, pois ela é responsável pelos atos de seus empregados e dirigentes. Assim, a reparação pecuniária decorrente da comprovação da ocorrência do assédio moral recai somente sobre empresa, isto é, somente ela é condenada judicialmente.

Cria-se neste ponto a primeira controvérsia: não sendo o dirigente condenado pelo citado assédio, mas a empresa da qual faz parte, pode-se aplicar a vedação ou restrição constante no art. 4º, isto é, pode-se restringir ou vedar os empréstimos concedidos pelo BNDES?

Outro problema que surge é que na esfera penal não há previsão legal do crime de assédio moral, razão pela qual não haverá a condenação criminal de qualquer empregado ou dirigente, o que pode inviabilizar a aplicação da mencionada restrição ou vedação.

Assim, foi aberto amplo campo para controvérsias acerca da previsão contida no art. 4º, da Lei n. 11.948/09, que provavelmente assolarão ainda mais o Poder Judiciário e gerarão entendimentos diversos nos Tribunais do país.

Deve-se ressaltar que é louvável a atitude do legislador nacional em criar mecanismos para punir empresas que são coniventes com o assédio moral em seu ambiente de trabalho. Entretanto, a medida adotada deveria ter observado melhor rigor técnico como, por exemplo, constar no referido art. 4º que a vedação ou restrição se aplicaria também em caso de condenação da empresa por assédio moral.

No entanto, o que todos esperam é a criação de legislação nacional própria para o assédio moral, a fim de que seja mais facilmente coibido nos ambientes laborativos.

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Júlio César de Paula Guimarães Baía
Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da UFMG
Pós-graduado pela Fundação Getúlio Vargas
Mestre em Direito pela Faculdade de Direito da UFMG
Professor Universitário – Faculdade Arnaldo Janssen e Faculdade UNA
Sócio do escritório Guimarães, Osório, Pinheiro e Advogados Associados
julio@guimaraesosoriopinheiro.com.br
Telefone: (31) 3227-7287

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2 respostas para “O Assédio Moral e a Legislação Brasileira”

  1. Primeiramente, parabéns Julio pelo texto objetivo e claro.
    Me deparo, dia após dia, com supostas vitimas de assedio moral e percebo a dificuldade de se provar o assedio. Pessoas procuram detetives particulares para solicitar coleta de provas; sugiro abordar o tema de investigação particular em casos de assedio.

    https://ferreiradetetive.com.br/

  2. Sr. Júlio
    Gostei muito do seu artigo, mas particularmente, acredito que o problema não está na prova, já que existem várias situações que podem ser enquadradas como assédio. Por experiência própria, acredito que o problema está em quem julga estes processos, pois parece-me que muitas vezes o assédio tem que ser “escancarado” para que seja reconhecido. Muitos juristas não levam em conta o assédio velado, o qual não há muitas vezes testemunhas para ratificar as alegações. Tendo em mente que há muitos processos administrativos contra juristas por assédio, me questiono: Será que muitas atitudes de assédio não são ditas “normais” ou “corriqueiras” para os que julgam? Sou doutora em Linguística Forense e li muito a respeito de assédio, mas muitos casos não são examinados minunciosamente e várias atitudes do assediador são tidas como convencionais!
    Grata

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