A questão das férias no Direito Trabalhista

Entre as reclamações trabalhistas mais ajuizadas nos tribunais brasileiros está o pagamento errôneo das férias ao trabalhador, sendo ele registrado conforme as regras da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) ou não. Apesar da clareza da CLT quando discorre sobre o direito a férias para os trabalhadores, muitos empregadores influenciam o funcionário a assinar algum documento abrindo mão desse direito. No entanto, no que diz respeito ao Poder Judiciário, nenhum documento tem poder caso ele se sobreponha à lei, conquanto não tem validade perante um processo judicial.

O capítulo IV da CLT rege toda a regulamentação acerca das férias, desde duração até quando ela deve ser concedida, além de peculiaridades do referido direito ao descanso do trabalhador. Entre as questões usualmente desrespeitadas pelo empregador estão a duração, a possibilidade de venda de parte e a periodicidade das férias.

  • Duração: segundo o artigo 130 da CLT, a cada 12 (doze) meses trabalhados o empregado terá direito à 30 (trinta) dias corridos de folga, salvo em casos de faltas não justificáveis em maior número que 5 (cinco) vezes. Este período total pode ser dividido em duas etapas, desde que nenhum dos tempos seja inferior a 10 (dez) dias.
  • Venda de férias: o trabalhador tem o direito facultativo de converter 1/3 (um terço) do período de férias à que tem direito em abono pecuniário, convertendo os dias correspondentes ao valor da remuneração.
  • Periodicidade: conforme explicitado no quesito duração, o período de férias é de 30 (trinta) dias a cada 12 meses. Tal período de folga deve ocorrer nos 12 (doze) meses subsequentes ao vencimento, com pena de a empresa ter que pagar o dobro do devido.

O empregador pode também optar por férias coletivas uma ou duas vezes por ano, desde que cada período não seja inferior a 10 (dez) dias. No caso de férias coletivas, há legislação específica no conteúdo da CLT, que indica a necessidade de aviso ao Ministério do Trabalho sobre a prática com ao menos 15 (quinze) dias de antecedência, além de aviso prévio a todos os funcionários e departamentos que gozarão do benefício. Tal descanso também será remunerado, e seguirá a proporção devido para empregados que possuam menos de 12 (doze) meses de registro na função.

Diversas reclamações trabalhistas são ajuizadas diariamente no que diz respeito a má fé dos empregadores quanto à legislação vigente no quesito férias. Quando o empregado se sente lesado, deve procurar um advogado trabalhista e iniciar a busca por seus direitos. Antes de iniciar o processo, um juiz da vara compatível tenta realizar conciliação entre as partes. Quando não há êxito na tarefa, inicia-se o recolhimento e apresentação de provas e testemunhas de ambas as partes e o julgamento da reclamação trabalhista têm início de fato.

Maristela Duarte
Estudante de Direito – Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo/SP
mariduarte_silva@hotmail.com

Do Crédito Trabalhista em Face das Empresas em Recuperação Judicial

A Lei 11.101/2005, regulou a recuperação judicial, extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária.

Referida lei, em seu artigo 6º, § 2º, estabelece que é permitido pleitear, perante o administrador judicial, habilitação, exclusão, ou modificação de créditos derivados da relação de trabalho, porém, as ações de natureza trabalhista, inclusive, as impugnações a que se refere o artigo 8º da Lei, serão processadas perante a Justiça Especializada até a apuração do respectivo crédito, o qual será inscrito no quadro-geral de credores pelo valor determinado em sentença.

Ainda, o § 5º, do artigo 6º, determina a suspensão da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, pelo prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias (§ 4º, do artigo 6º), contados do deferimento do processamento da recuperação, sendo certo que, após o decurso deste prazo, as execuções trabalhistas poderão ser normalmente concluídas, mesmo que o crédito já esteja inscrito no quadro-geral de credores.

É dizer, portanto, que a execução trabalhista pode vir a prosseguir, de forma concomitante à habilitação do crédito constituído perante o juízo da recuperação judicial.

E com isso, não haveria impedimento para que a execução prosseguisse em face dos bens da empresa e dos sócios, fazendo com que os bens de ambos viessem a ser posteriormente penhorados por determinação da Justiça Especializada.

Inclusive, o mais comum argumento para o prosseguimento da execução trabalhista em face da empresa em plano de recuperação judicial se baseia no fundamento de que o crédito trabalhista possui natureza alimentar, o que lhe confere posição superprivilegiada, até mesmo, em detrimento do crédito tributário.

O caput do artigo 186, do Código Tributário Nacional, retrata bem mencionado entendimento, ao dispor que: “…O crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for sua natureza ou o tempo de sua constituição, ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente do trabalho…”. nossos os grifos

No entanto, independentemente de ser ou não determinada a continuidade da execução pela Justiça Especializada, com a possível penhora de bens da empresa, em contrapartida, o Supremo Tribunal Federal, através da decisão proferida no RE nº 583955-RJ, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Julgamento: 28.05.2009, DJE: 28.08.2009, já se posicionou na acepção de que a execução de créditos trabalhistas contra empresa em recuperação judicial deverá prosseguir perante o Juízo onde fora aprovado o plano de recuperação judicial, uma vez que a Justiça Especializada é competente apenas para constituir o crédito em questão.

Neste sentido, confira-se a ementa da R. Decisão:

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. EXECUÇÃO DE CRÉDITOS TRABALHISTAS EM PROCESSOS DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL COMUM, COM EXCLUSÃO DA JUSTIÇA DO TRABALHO. INTERPRETAÇÃO DO DISPOSTO NA LEI 11.101/05, EM FACE DO ART. 114 DA CF. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E IMPROVIDO. I – A questão central debatida no presente recurso consiste em saber qual o juízo competente para processar e julgar a execução dos créditos trabalhistas no caso de empresa em fase de recuperação judicial. II – Na vigência do Decreto-lei 7.661/1945 consolidou-se o entendimento de que a competência para executar os créditos ora discutidos é da Justiça Estadual Comum, sendo essa também a regra adotada pela Lei 11.101/05. III – O inc. IX do art. 114 da Constituição Federal apenas outorgou ao legislador ordinário a faculdade de submeter à competência da Justiça Laboral outras controvérsias, além daquelas taxativamente estabelecidas nos incisos anteriores, desde que decorrentes da relação de trabalho. IV – O texto constitucional não o obrigou a fazê-lo, deixando ao seu alvedrio a avaliação das hipóteses em que se afigure conveniente o julgamento pela Justiça do Trabalho, à luz das peculiaridades das situações que pretende regrar. V – A opção do legislador infraconstitucional foi manter o regime anterior de execução dos créditos trabalhistas pelo juízo universal da falência, sem prejuízo da competência da Justiça Laboral quanto ao julgamento do processo de conhecimento. VI – Recurso extraordinário conhecido e improvido. nossos os grifos

Corroborando o mesmo entendimento, o Superior Tribunal de Justiça assim decidiu, verbis:

PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO RECEBIDO COMO AGRAVO REGIMENTAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO TRABALHISTA E JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PROSSEGUIMENTO DAS EXECUÇÕES TRABALHISTAS APÓS A FASE DE ACERTAMENTO E LIQUIDAÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO UNIVERSAL DA RECUPERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RETOMADA AUTOMÁTICA DAS EXECUÇÕES APÓS O FIM DO PRAZO DE 180 DIAS. NÃO CABIMENTO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que, ultrapassada a fase de acertamento e liquidação dos créditos trabalhistas, cuja competência é da Justiça do Trabalho, os valores apurados deverão ser habilitados nos autos da falência ou da recuperação judicial para posterior pagamento (Decreto-Lei 7.661/45; Lei 11.101/2005). 2. O entendimento desta Corte preconiza que, via de regra, deferido o processamento ou, posteriormente, aprovado o plano de recuperação judicial, é incabível a retomada automática das execuções individuais, mesmo após decorrido o prazo de 180 dias previsto no art. 6º, § 4º, da Lei 11.101/2005. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ – RCD no CC 131894 SP 2013/0414833-7 – Relator: Min. Raul Araújo – Julgamento: 26/02/2014 – Órgão Julgador: S2 – Segunda Seção – Publicação: DJE 31/03/2014). nossos os grifos

Sendo assim, não há como a execução do crédito líquido trabalhista se processar na Justiça Especializada, quando a legislação ordinária estabeleceu um juízo coletivo de credores, incluindo-se o credor trabalhista, ressalvada, entretanto, a particularidade de satisfação do crédito, no que diz respeito a prazo para recebimento, valor, ordem de pagamento, etc.

Conclui-se, portanto, respeitando-se a individualidade de cada caso concreto, que se o crédito trabalhista líquido se encontrar habilitado e devidamente homologado pelo Juízo da recuperação judicial, é evidente que o mesmo deverá ser satisfeito por este último, nas formas e condições previstas na Lei 11.101/2005.

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Dra. Gislane Setti Carpi de Moraes

Advogada da Ozi, Venturini & Advogados Associados

gislane@oziventurini.com.br

A obrigatoriedade do estabelecimento comercial em aceitar o pagamento de compra de cigarro por meio de cartão de débito e crédito

Embora esse assunto esteja superado há muito, ainda há grande dúvida dos consumidores quanto a possibilidade do pagamento pela compra de cigarros, por meio de cartão de crédito e/ou débito.

Muitos estabelecimentos comerciais não vendem cigarro por meio de pagamento com cartão de débito e/ou crédito. Ou pior, promovem a venda por tal modalidade, cobrando um valor aleatório ou mesmo um percentual sobre o preço.

No entanto, se o estabelecimento comercial aceita o pagamento de suas mercadorias por meio de cartão de débito e/ou de crédito, não pode selecionar o produto que pode ser pago por tal modalidade, muito menos cobrar algum valor sobre o preço.

Isto é, caso o estabelecimento comercial disponibilize o pagamento de seus produtos por meio de cartão, não se pode escolher o que pode ser pago ou não por tal meio.

Na prática, é comum que o comerciante separe os pagamentos das mercadorias, proibindo que o consumidor efetue a compra de cigarros pagando com cartão.

A negativa do estabelecimento comercial em promover a compra de cigarros por meio de cartão de débito e/ou de crédito é considerada prática abusiva, que infringe as normas vigentes insculpidas no Código de Defesa do Consumidor, conforme preceitua o artigo 51, XII.

Note-se que, uma vez disponibilizadas as formas de pagamento, naquele estabelecimento comercial, como cartão de débito e/ou crédito, seu uso não pode ser restrito ou limitado. Como também não é possível fazer acréscimos no cartão ou condicionar a aceitação à compra a partir de determinada quantia.

Frise-se que o ato de estabelecer valor mínimo, recusar venda por meio de cartão de débito e/ou crédito ou cobrar acréscimo sobre o preço, enseja multa ao estabelecimento, que varia de R$ 200,00 a R$ 3.000.000,00, calculada com base no faturamento da empresa.

Destaque-se que, pelo entendimento que se faz do Código de Defesa do Consumidor, aceitar cartões é vantajoso ao lojista na medida em que reduz inadimplência e aumenta a base de clientes.

Portanto, não se pode repassar o custo do benefício ao consumidor. Logo, à evidência, o estabelecimento deve avaliar se as transações com cartão de débito e/ou crédito são vantajosas, sendo que, em caso afirmativo, é preciso aceitá-las em todas as situações.

Importante mencionar que, a não obrigatoriedade de aceitar o pagamento da compra do cigarro por meio de cartão, ocorre somente quando o estabelecimento não opera com cartão de nenhuma forma, para nenhum produto. Mas, se o comércio não aceita pagamento por meio de cartão de débito e/ou crédito, deve disponibilizar tal informação em local visível, sendo certo que tal prática servirá para todos os produtos vendidos naquele comércio.

Importante mencionar que o Procon é o órgão fiscalizador e, detectadas as irregularidades, o empresário pode ser autuado, submetendo-se a imposição de multa, que pode chegar a R$ 3.000.000,00, repita-se.

É de conhecimento geral que a comercialização de cigarro traz uma lucratividade muito ínfima aos estabelecimentos em geral.

Como também, é de conhecimento notório que as administradoras de cartão cobram dos lojistas taxas pela disponibilização e utilização de máquinas para operação com cartão de débito e/ou crédito.

Porém, é inadmissível penalizar o consumidor cobrando valor adicional ou mesmo impondo importância mínima, eis que tal ato afronta o Código de Defesa do Consumidor.

Também, denote-se que, além de previsão contida no Código de Defesa do Consumidor, há Resolução específica do Conselho Nacional de Defesa do Consumidor, que avalia como irregular os acréscimos de preço nas compras feitas com cartão de crédito. Para o órgão, essas transações seriam caracterizadas como compras à vista, tanto no caso do débito, como para os pagamentos em parcela única nos cartões de crédito.

Ora, se o comerciante instalou a máquina para potencializar suas vendas, não pode repassar esse custo ao cliente, até porque o volume de vendas é consideravelmente maior quando disponibilizado o pagamento por meio de cartão.

Outro fator importante a considerar é a hipótese do lojista estipular valor mínimo para pagamento por meio de cartão de débito e/ou crédito. Considerando que o cigarro possui valor inexpressivo, muitos comerciantes também atrelam a negativa da venda por meio de cartão, estipulando o valor mínimo.

Note-se que a própria Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços condenou a prática de imposição de consumo mínimo, afirmando que a conduta não pode ser adotada pelas empresas credenciadas à entidade.

O ato de impor um valor mínimo para pagamento com cartão é o mesmo que determinar a consumação mínima, que também é vedada por lei. A empresa que atua dessa maneira comete dois crimes de relação de consumo, a saber: negar a venda a pronto pagamento, a quem se dispõe a pagar o valor e a venda casada, na qual o consumidor é obrigado a levar outros produtos para totalizar determinado valor.

Outrossim, importante esclarecer que a desculpa comum do lojista que alega que existe um “bloqueio” na máquina do cartão, não procede. Os bancos e as administradoras de cartão têm interesse em receber o percentual sobre qualquer valor de venda, até porque se trata de um percentual e não de uma tarifa fixa.

Ainda, importa mencionar que, no caso da compra realizada por meio de cartão, caso não seja parcelada, deve-se cobrar o mesmo valor daquele cobrado com pagamento em dinheiro.

Por fim, esclarece-se que, embora o presente artigo enfoque na compra de cigarro, a vedação prevista no Código de Defesa do Consumidor relacionada a negativa de pagamento por meio de cartão, vale para qualquer produto.

Contudo, o estabelecimento pode aceitar ou não o cartão de débito/crédito. Porém, uma vez que oferece esse serviço ao cliente, não pode fazer restrições. O consumidor deverá promover reclamação junto ao Procon, caso o estabelecimento comercial adote uma das práticas supra mencionadas. Para que o Procon atue, é necessário que o consumidor não se omita. Ou seja, não importa se o valor é pequeno, o consumidor deve delatar as práticas abusivas ao órgão competente.

Dr. Alexandre Venturini
Advogado e sócio do escritório Ozi, Venturini & Advogados Associados
alexandre@oziventurini.com.br

Corretor de imóveis pode ser MEI?

Milhares de corretores de imóveis, em todo o Brasil, buscam desde 2008, respostas e essa pergunta. Infelizmente, muitas informações contraditórias tem sido publicadas na Internet, aumentando as dúvidas e trazendo angústia a muitos profissionais.

O que é MEI?

O MEI (Microempreendedor individual) é uma categoria de atividade empresarial criada pela Lei Complementar 128, de 2008.

O Simples Nacional, criado pela LC 123 de 2006, com o propósito de extender a base de captação de tributos e de proteção social aos trabalhadores informais, não trazia mecanismos suficientes para tal. Houve um crescimento exponencial da regularização de pequenos negócios, mas os profissionais que trabalham individualmente não conseguiram se enquadar.

Desde 2008, com a criação do MEI, cerca de 5 milhões de profissionais informais se tornaram microempreendedores individuais.

Quais as vantagens de ser MEI?

O microempreendedor individual recebe um número de CNPJ, que amplia as possibilidades de aquisição e venda de produtos e serviços, facilita na abertura de conta bancária, na obtenção de empréstimos e na emissão de notas fiscais;

O MEI se enquadra no Simples Nacional, o que o isenta de tributos Federais, como imposto de renda, PIS, Cofins, etc;

Recolhe, mensalmente, um valor fixo de tributos, o que facilita na gestão e na permanência no programa;

O MEI também tem direito a todos os benefícios previdenciários (auxílio doença, auxílio acidente, salário maternidade, aposentadoria, etc);

Pode, também, ter um funcionário para o ajudar em suas atividades.

Quanto um MEI recolhe de tributos por mês?

Na taxa mensal está incluída a contribuição previdenciária (5% do salário mínimo) e a contribuição Estadual (ICMS) ou Municipal (ISS), dependendo se a atividade for de comércio ou prestação de serviços;

Atualmente, em 2015:

Comerciante: R$ 40,40 (R$ 39,40 para a Previdência e R$ 1,00 de ICMS);

Prestador de serviços: R$ 44,40 (R$ 39,40 para a Previdência e R$ 5,00 de ISS);

Comércio e serviços: R$ 45,40 (Previdência, ISS e ICMS);

Afinal de contas, corretor de imóveis pode ser MEI?

Não. Infelizmente, corretores de imóveis não podem ser MEI.

O propósito principal do MEI é formalizar as atividades que não tem regulamentação legal. Tirar da informalidade, aumentando a base de tributação do Governo e ampliando a proteção aos profissionais informais. O corretor de imóveis, por ser uma profissão regulamentada em lei (há décadas, diga-se) não se enquadra no público alvo do programa.

A confusão surgiu quando foi inserida, pela Lei Complementar 147 de 2014, a categoria de corretores de imóveis na lista de atividades que podem optar pelo Simples Nacional. Desde janeiro de 2015, portanto, os corretores de imóveis podem ser optantes pelo Simples Nacional, mas jamais enquanto MEI.

A confusão aumentou depois que o CRECI-SP publicou um roteiro para os corretores de imóveis, de como se tornarem MEI. Infelizmente, esse documento permanece disponível para download, na web.

Portanto, um corretor de imóveis, que quiser se beneficiar do Simples Nacional, deverá se tornar Empresário Individual, EIRELI ou abrir uma sociedade empresária.

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Marcelo Branco Gómez
Bacharel em Direito pela ESAMC-Santos e Advogado Previdenciário.
marcelobranco.adv@gmail.com

O mercado de trabalho para Bacharéis em Direito

Direito é a ciência humana que cuida da aplicação das normas jurídicas vigentes em um país para organizar as relações entre indivíduos integrantes de uma sociedade. Zelar pela harmonia e pela correção das relações entre os cidadãos, as empresas e o poder público é a função do bacharel em direito, sendo a análise de conflitos e a defesa de interesses suas principais atribuições.

Em virtude destas características, a área jurídica possui grande aceitação no mercado de trabalho do setor privado, embora também seja amplamente compatível com o setor público,o que abre uma gama de possibilidades aos bacharéis em Direito.

Tradicionalmente, o Bacharel em Direito possui duas carreiras distintas que pode seguir: ele pode atuar como advogado ou seguir a carreira jurídica no setor público, trabalhando como advogado público, juiz, promotor de Justiça ou delegado de polícia. Para ser advogado é preciso passar em exame da OABpara as demais atribuições públicas é necessário ser aprovado em um concurso. No caso especial do Juiz, além do concurso público, é necessário o tempo mínimo de 3 anos de atuação jurídica, o que remete a necessidade de aprovação no Exame da Ordem.

Outra boa notícia para Bacharéis em Direito é que o que o faltam concursos com vagas específicas para candidatos com esta graduação, incluindo alguns cargos de grande prestígio. A maior parte das oportunidades é para advogados públicos, com ou sem experiência. Apesar disto, mesmo para concursos que não sejam específicos para Bacharéis em Direito, grande parte das provas de concursos públicos exigem matérias relacionadas ao curso de Direito, tais como Direito Administrativo e Direito Constitucional que são exigidos em praticamente todos os concursos. Para os concursos que exigem formação em Direito, a obrigatoriedade da OAB  é indispensável, sendo que alguns ainda exigem algum tipo de especialização, pós-graduação ou tempo de experiência.

Atualmente, três áreas do Direito vêm se destacando no mercado de trabalho e estão sendo muito valorizadas e bem remuneradas: Direito do Consumidor; Direito Ambiental; e Direito Imobiliário. Apesar disto, você pode seguir diversas linhas dentro do Direito, com intuito de aproximar mais de seus interesses pessoais.

Recomendações de linhas de atuação no Mercado para Bacharéis em Direito

  – Advocacia pública: defender cidadãos que não podem pagar por uma acessória jurídica ou como procurador municipal, estadual ou da união.

  – Arbitragem internacional: resolver disputas comerciais, fiscais e aduaneiras relacionadas ao comércio internacional.

  – Direito Administrativo: aplicar a legislação vigente que regulamenta os órgãos e poderes públicos em sua relação com a sociedade.

  – Direito Ambiental: trabalhar em ONGs e empresas do ramo, lidando com questões que envolvam a relação do homem com o meio ambiente como, por exemplo, a deterioração da natureza provocada pelas atividades industriais de determinada empresa.

  – Direito Civil: representar interesses individuais e particulares em ações referentes à propriedade e posse de bens, questões familiares, como divórcios e heranças, ou transações de locação, compra e venda.

  – Direito Comercial: intermediar as relações jurídicas no comércio, aplicando as legislações federais, estaduais e municipais na abertura, manutenção e encerramento de estabelecimentos comerciais.

  – Direito Contratual: assessorar pessoas físicas e/ou jurídicas na elaboração e assinatura de contratos dos mais variados temas.

  – Direito da Tecnologia da Informaçãoanalisar questões jurídicas ligadas ao uso da informática e às relações entre usuários, agentes e fornecedores, como empresas desenvolvedoras de softwares, prestadores de serviço de TI, dentre outros.

  – Direito da Propriedade Intelectual: preservar e defender os direitos de autores sobre sua obra, as protegendo de plagio e falsificações. Esta ramificação do Direito também abrange questões relacionadas ao registro de marcas e patentes.

  – Direito do Consumidor: aplicar as normas do Código de Defesa do Consumidor com objetivo de resguardar os direitos dos cidadãos perante fornecedores de bens e serviços.

  – Direito Penal ou Criminal: defesa ou acusação em ações referentes a crimes ou conflitos contra pessoas físicas e/ou jurídicas.

  – Direito Trabalhista e Previdenciário: assessorar empregado e/ou empregador em conflitos trabalhistas, questões sindicais ou relacionadas à previdência social.

  – Direito Tributário: assessorar o cumprimento de normas relativas à arrecadação de impostos e obrigações tributárias de atribuições dos órgãos fiscalizadores.

  – Magistratura: julgar processos e expedir mandados de prisão, de busca ou apreensão, podendo ter atuação como Juiz Federal (lida principalmente com assuntos relacionados aos tributos federais e previdência social); ou Juiz da Justiça (com foco voltado a resolução de conflitos).

  – Ministério Público: defender interesses da sociedade, promover ações penais, apurar responsabilidades e fiscalizar o cumprimento das leis. O Promotor de Justiça defende no tribunal os interesses de causas sociais, como defesa do meio ambiente, direitos do consumidor, patrimônio cultural e histórico, etc.

Fernando Barcellos
Editor do site Prova da Ordem

O Assédio Moral e a Legislação Brasileira

Tema de grande relevância e amplamente discutido nos Tribunais pelo país é o assédio moral. Ele nada mais é do que qualquer conduta praticada reiteradamente pelo empregador ou por empregado em face de subordinado ou colega de trabalho, com o intuito de atacar a dignidade do trabalhador ou seus direitos, sua higidez física ou mental. É também qualquer outro ato capaz de comprometer sua carreira profissional ou que degrade o ambiente de trabalho.

Trazendo para o plano concreto, estas condutas são aquelas frequentemente observadas em grande parte das empresas como, por exemplo, a humilhação constante de colega de trabalho.

O tema é tão relevante que a Organização Internacional do Trabalho realizou estudos na União Européia e concluiu que pelo menos 9% dos trabalhadores do mencionado bloco sofrem com tratamento tirânico de seus patrões.

Ocorre que até o presente momento o tema assédio moral não foi regulamentado pela legislação brasileira. Apesar de não impedir a condenação judicial de quem o pratica, tal fato é bastante prejudicial, eis que não existem critérios definidos sobre sua caracterização e, sobretudo, a respeito de suas conseqüências. Na prática a doutrina vem se encarregando desta tarefa estabelecendo seu conceito, sendo a reparação pecuniária garantida pelo Poder Judiciário.

Diversos projetos de lei tramitam no Congresso Nacional sem que se chegue à necessária regulamentação em âmbito federal.

Entretanto, em 16 de junho de 2009 a Medida Provisória n. 453/08 foi convertida na Lei n. 11.948/09, que versa sobre a constituição de fonte adicional de recursos para ampliação de limites operacionais do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e dá outras providências. Dentre estas, nota-se a disposição contida no seu art. 4º, que veda “a concessão ou renovação de quaisquer empréstimos ou financiamentos pelo BNDES a empresas da iniciativa privada cujos dirigentes sejam condenados por assédio moral ou sexual, racismo, trabalho infantil, trabalho escravo ou crime contra o meio ambiente”.

Apesar da citada Lei não se referir propriamente ao assédio moral, em uma primeira análise parece louvável a restrição prevista para os casos de condenação de dirigentes de empresas privadas por assédio moral.

Entretanto, vislumbra-se problema na referida previsão legal. A regra prevê a restrição ou vedação de empréstimo financeiro concedido pelo BNDES nos casos em que os dirigentes de empresas privadas forem condenados por assédio moral. Ocorre que no âmbito trabalhista este fato raramente ou nunca se concretiza, pois o empregado vítima do assédio moral aciona somente a empresa junto ao Poder Judiciário, pois ela é responsável pelos atos de seus empregados e dirigentes. Assim, a reparação pecuniária decorrente da comprovação da ocorrência do assédio moral recai somente sobre empresa, isto é, somente ela é condenada judicialmente.

Cria-se neste ponto a primeira controvérsia: não sendo o dirigente condenado pelo citado assédio, mas a empresa da qual faz parte, pode-se aplicar a vedação ou restrição constante no art. 4º, isto é, pode-se restringir ou vedar os empréstimos concedidos pelo BNDES?

Outro problema que surge é que na esfera penal não há previsão legal do crime de assédio moral, razão pela qual não haverá a condenação criminal de qualquer empregado ou dirigente, o que pode inviabilizar a aplicação da mencionada restrição ou vedação.

Assim, foi aberto amplo campo para controvérsias acerca da previsão contida no art. 4º, da Lei n. 11.948/09, que provavelmente assolarão ainda mais o Poder Judiciário e gerarão entendimentos diversos nos Tribunais do país.

Deve-se ressaltar que é louvável a atitude do legislador nacional em criar mecanismos para punir empresas que são coniventes com o assédio moral em seu ambiente de trabalho. Entretanto, a medida adotada deveria ter observado melhor rigor técnico como, por exemplo, constar no referido art. 4º que a vedação ou restrição se aplicaria também em caso de condenação da empresa por assédio moral.

No entanto, o que todos esperam é a criação de legislação nacional própria para o assédio moral, a fim de que seja mais facilmente coibido nos ambientes laborativos.

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Júlio César de Paula Guimarães Baía
Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da UFMG
Pós-graduado pela Fundação Getúlio Vargas
Mestre em Direito pela Faculdade de Direito da UFMG
Professor Universitário – Faculdade Arnaldo Janssen e Faculdade UNA
Sócio do escritório Guimarães, Osório, Pinheiro e Advogados Associados
julio@guimaraesosoriopinheiro.com.br
Telefone: (31) 3227-7287

Breves apontamentos sobre a teoria do processo como relação jurídica

Luiza Carla Santos Araújo[1]

Resumo: O presente ensaio tem como escopo apresentar a teoria do processo como relação jurídica, fazendo um breve paralelo entre as outras teorias que procuraram explicar a natureza do processo. Além disso, pretende-se abordar as principais características desta teoria adotada pelo Código de Processo Civil brasileiro e as algumas críticas apontados por outros processualistas.

 Palavras-chave: Teoria do processo – Procedimento – Relação Jurídica – Bülow

 Abstract: This essay is scope to present the theory of the case as a legal relationship, making a brief parallel between the other theories that sought to explain the nature of the process. In addition, we intend to address the main features of this theory adopted by the Brazilian Code of Civil Procedure and some critics pointed out by other procedural experts.

Keywords: Process Theory – procedure – Legal Relationship – Bülow

 Sumário: 1. Introdução; 2. A Teoria do Processo como Relação Jurídica; 2.1. Características da Relação Jurídico-Processual; 2.2. Processo e Procedimento; 2.3. Elementos da Relação; 2.4. Sujeitos da Relação; 3. Críticas; 4. Considerações Finais; 5. Referências

1. Introdução

Apesar das polêmicas sobre a natureza jurídica do processo, é ele hoje encarado como o instrumento para o exercício da jurisdição, função que o Estado exerce com autoridade própria, soberana, independentemente da voluntária submissão das partes, diversamente do que ocorria no direito romano em que ele era o resultado de um contrato celebrado entre estas (litiscontestatio), através do qual surgia o acordo no sentido de aceitar a decisão que fosse proferida.

Ao longo do tempo vários estudos foram feitos na área do Direito Processual, e com eles surgiram algumas teorias com o intuito de definir a natureza jurídica deste instituto.

As muitas teorias que existiram e existem sobre a natureza jurídica do processo revelam a visão publicista ou privativista assumida por seus formuladores, sendo que algumas delas utilizam conceitos romanísticos sobreviventes à sua própria aplicação prática. As principais entre elas apontam no processo a natureza de: a) contrato; b)quase-contrato; c) relação jurídica processual; d) situação jurídica; e) procedimento informado pelo contraditório. [2]

Segundo a visão privatista, o processo tem a mesma natureza de um contrato ou quase-contrato. Se referindo ao contrato, afirmam que a relação existente no processo, entre o autor e o réu era vista idêntica a que une as partes contratantes. Outra teoria afirmava que o processo era um quase-contrato. Para esses, quanto ao réu, não era necessária previa aceitação dos efeitos da sentença, mas, quanto ao autor, seu ingresso em juízo representava seu prévio consentimento aos resultados do processo. Já as teorias publicistas, tem o processo, primeiro, como serviço público, segundo, o processo como situação jurídica e, terceiro, o processo como relação jurídica.

 2. A Teoria do Processo como Relação Jurídica

 A Teoria do Processo como contrato e do Processo como quase-contrato, em pouco favoreceu o sistema processual. Ambas, voltadas para o âmbito privado foram fortemente criticadas.

No ano de 1868, Oskar von Bullow publica na Alemanha a obra “ A teoria das Exceções Processuais e os Pressupostos Processuais” que foi um marco da autonomia do processo diante o conteúdo do direito material.

É que Bülow trabalhou pressupostos de existência e desenvolvimento do processo pela relação juiz, autor e réu, em que, para validade e legítima constituição do processo seriam necessários requisitos que o juiz, autor e réu deveriam cumprir conforme disposto em lei processual, enquanto que o direito disputado e alegado pelas partes se situava em plano posterior à formação do processo, distinguindo-se pela regulação em norma de direito material, criadora do bem da vida que define a matéria de mérito.[3]

Essa teoria nasce a partir do momento em que o Estado assume para si a obrigação de solucionar o conflito de interesses, o que antes era feito de maneira particular através da autotutela dos próprios interesses. Com o passar do tempo o Estado foi sendo requerido pelos indivíduos para solucionar os problemas concernentes ás relações. O Estado deixa de ser mero espectador das relações realizadas entre os particulares e passa a ter o poder de jurisdição tendo, portanto, a obrigação de resolver os conflitos de interesses.

O processo é considerado, nesta teoria, como relação jurídica, pelo fato de demandante, demandado e juiz estabelecerem uma relação jurídica que incumbirá na decisão de prolatar sentença definindo o ato jurisdicional, seguindo os direitos e obrigações criados nos procedimentos desta relação. Ainda, no processo existem duas categorias distintas de relações jurídicas: a material e a formal.

Calucci e Almeida exemplificam, com excelência, como se dá essas duas relações jurídicas:

No processo, o autor pleiteia o pagamento de uma quantia que lhe é devida; antes de peticionar em juízo, já existia entre este mesmo autor e o mesmo réu um vínculo, ou seja uma relação jurídica de direito material, fundada num contrato, no qual o autor figura como credor e o réu como devedor; somente depois de vencido o prazo, e não paga a dívida, é que o titular do direito de crédito veio a juízo reclamar o inadimplemento do contrato, iniciando-se a relação jurídica processual, que só se completou com o chamamento do réu a juízo através da citação. [4]

 2.1 Características da relação jurídico-processual

 Marcus Orione Gonçalves Correia em sua obra Teoria Geral do Processo, disserta sobre as características da relação jurídico-processual. Segundo ele, a primeira peculiaridade que constitui o processo é a sua autonomia. O objeto e as partes são distintos da relação jurídico-material, sendo independentes desta. Ou seja, enquanto o objeto da relação jurídico-processual é a prestação jurisdicional, o de direito material é o bem disputado pelas partes.

Por outro lado, a relação jurídico-processual é complexa e dinâmica, compreendendo uma serie extensa de direitos, deveres, ônus, faculdades, poderes e obrigações. Logo, a complexidade e a dinamicidade da relação processual, decorrentes de um constante movimento, possibilitam alterações nos vínculos estabelecidos entre os seus sujeitos.

Outra característica dessa relação jurídica é a unidade, conferida pela sentença. Os atos realizados, interligados entre si, tendem a uma finalidade, que é a sentença. A essa relação há que se referir a unidade teleológica.

Por fim, tem-se a natureza pública da relação jurídico-processual. O Estado, representado pelo juiz, em posição de comando em relação aos outros sujeitos processuais, decorrente do jus imperii, resolve a pendência, pacificando o conflito por meio da prolação da sentença. Assim, em vista da necessidade de que a vontade das partes seja substituída pela vontade estatal, para obtenção do intento de pacificação social, aquela primeira esta jungida à determinação emanada da sentença.[5]

2.2 Processo e Procedimento

Durante muito tempo, o processo (do latim, procedere = seguir adiante) foi confundido com procedimento, ou seja, como sendo simples sucessão de atos processuais.

Contudo, desde 1868, com a obra de Bülow (Teoria dos pressupostos processuais e das exceções dilatória), apercebeu-se a doutrina de que há, no processo, uma força que motiva e justifica a prática dos atos do procedimento, interligando os sujeitos processuais. O processo, então, pode ser encarado pelo aspecto dos atos que lhe dão corpo e das relações entre eles e igualmente pelo aspecto das relações entre os seus sujeitos. [6]

2.3 Elementos da Relação

 Três teorias surgiram para caracterizar a relação processual. A teoria linear, de Kohler, define a relação como intrapartes, tornando o juiz estranho à relação processual estabelecida. Já teoria triangular, representada por grandes nomes do Direito Processual, a começar pelo criador da tese em estudo neste trabalho, Bülow, passando por Wach, Chiovenda e Calamandrei, entre outros, é a teoria majoritária. Segundo esta teoria, autor, réu e juiz vinculam-se direta e reciprocamente, nem mesmo precisando do juiz para intermediar a relação entre autor e réu. E, por fim, segundo Humberto Teodoro Júnior, há ainda a teoria angular, atribuída a Hellwig. Nela, o juiz se relaciona de forma superior às partes, uma vez que representa o poder estatal e essas estariam submetidas à sua soberania, fazendo com que elas obtivessem direitos e deveres voltados para o juiz.

2.4 Sujeitos da Relação

Em toda relação, obviamente, são imprescindíveis os sujeitos. Os sujeitos principais são o autor, o réu e o juiz. Existem os patronos das partes, que são os profissionais com o poder de exercer legalmente a função de defensores dos direitos requeridos pelas partes (os advogados). O Ministério Público também pode atuar como parte, substituto processual ou mesmo fiscal da lei. Por último, vemos os sujeitos secundários, que são basicamente os auxiliares da justiça e terceiros. [7]

3. Críticas

A teoria do processo como relação jurídica também foi alvo grandes críticas, principalmente, por parte dos percussores da teoria do processo como situação jurídica, como Goldschimidt. Sua tese central é a de que o processo não encerra uma relação jurídica entre seus sujeitos, pois não há direitos e deveres jurídicos entre eles. Segundo Goldschmidt, o que há no processo são possibilidades, ônus e expectativas, e não relação jurídica que, segundo a concepção tradicional, é constituída de direitos e deveres, realidades inexistentes no processo.

Para Goldschmidt, o processo não era uma relação jurídica, porque não concebia a existência de nexo entre as partes e o juiz e nem entre as próprias partes.

Entre as críticas dirigidas à doutrina da relação processual, além do que está dito na exposição da doutrina do processo como situação jurídica, figuram as seguintes: a) baseia-se na divisão do processo em duas fases (in jure apud judicem) com a crença de que na primeira delas apenas se comprovam os pressupostos processuais e na segunda apenas se examina o mérito, o que nem para o direito romano é verdadeiro; b) o juiz tem obrigações no processo, mas inexistem sacões processuais ao ser descumprimento; c) as partes não tem obrigações no processo, mas estão simplesmente no estado de sujeição à autoridade do órgão jurisdicional. [8]

Na Itália, as críticas partem de Elio Fazzalari, pela “Teoria da Reabilitação do Procedimento”, segundo a qual o instituto do processo há de ser visto como Procedimento realizado em Contraditório; no Brasil, de autores como Aroldo Plínio Gonçalves, por sua obra “Técnica Processual e Teoria do Processo”, e Rosemiro Pereira Leal, que, através da “Teoria Neo-Institucionalista”, concebe o Processo como uma instituição constitucionalizada.

Argumenta-se, ademais, que ao se identificar no processo um vínculo de subordinação das partes ao julgador acabou-se por colocar o juiz numa posição não só de equidistância em relação às partes, mas também de superioridade, permitindo-se que no Direito Processual Civil brasileiro o Estado, como juiz, assumisse posição autoritária (num processo autoritário) dominante e superior num dos pólos da proclamada relação jurídica processual, munido de poder de mando assemelhado ao dos soberanos do antigo regime.

As objeções à Teoria da Relação Jurídica se devem, principalmente, ao fato de a mesma ser notadamente calcada em postulados do Estado Liberal, mormente a autonomia da vontade, que inadmite a existência de direitos sem sujeitos, estes, considerados em posições antagônicas.

Sob outro foco, a crítica à teoria da relação jurídica processual volta-se à sua assimilação neutra e descompromissada com a realidade da vida do homem, isto é, da parte, e à sua transparência em relação à legitimidade do poder, do procedimento e da própria decisão.

O processo não pode ser visto apenas como relação jurídica, mas sim como algo que tem fins de grande relevância para a democracia e, por isso mesmo, deve ser legítimo. O processo deve legitimar – pela participação -, ser em si legítimo – adequado à tutela dos direitos e aos direitos fundamentais -, e ainda produzir uma decisão legítima.

4. Considerações Finais

O estudo da natureza jurídica do processo se torna imprescindível tanto para o desenvolvimento teórico como para a aplicação prática. A importância de conhecermos a natureza jurídica do processo tem a finalidade primordial de determinar as normas aplicáveis supletivamente. Se definirmos que o processo tem natureza do contrato, por exemplo, quando encontramos lacunas em suas normas usaremos subsidiariamente as leis do código civil para supri-las de acordo com o que a natureza jurídica processual fosse considerada.

Os conceitos processuais desenvolvidos por Büllow também contribuíram para o processo penal, possibilitando a passagem do procedimento inquisitivo para o acusatório, visto que o réu deixa de ser objeto da persecução estatal para figurar como sujeito da relação processual penal.

Deve-se também a essa teoria, a diferenciação entre processo e procedimento, de grande importância para se determinar a natureza jurídica do processo. Bullow define o procedimento como sendo as partes integrantes do processo, sendo este o conjunto de meros atos processuais. Para melhor compreensão do processo, e distinguí-lo do procedimento, nada mais apropriado do que o exemplo da viagem e do itinerário. A viagem em si seria o processo e itinerário seguido, o procedimento.

Foi a partir daí que se reconheceu a autonomia do processo ante o conteúdo do direito material.  Sem dúvida, um grande avanço teórico.

Aprimorada por Chiovenda, Carnelutti, Calamandrei e Liebman (este último foi aluno de Alfredo Buzaid, autor do Projeto de nosso Código de processo Civil de 1973), seus seguidores hoje são chamados de “instrumentalistas”. Encontrou terreno bem fértil entre os processualistas brasileiros, notadamente entre os que integram a denominada Escola Paulista, como Grinover, Cintra e Dinamarco.

Apesar das críticas, encontra-se firmada entre os doutrinadores contemporâneos a noção do processo como relação jurídica, que se estabelece entre as partes e o juiz, de natureza triangular. E é esta a teoria adotada pelo código de processo civil brasileiro.

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5. Referências

AGUIAR, Cynara Silde Mesquita Veloso de; COSTA, Fabrício Veiga; SOUZA, Maria Inês Rodrigues de. Processo, Ação e jurisdição em Oskar von Bülow. In: LEAL, Rosemiro Pereira (Coord.). Estudos continuados de Teoria do Processo. v. VI. Porto Alegre: síntese, 2005. p. 14-37.

CAETANO, Luis Mário Leal Salvador. O processo como relação jurídica. Disponivel em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/5887/O-processo-como-relacao-juridica>. Acesso em: 26 set. 2012

COLUCCI Maria da Glória Lins da Silva; ALMEIDA, José Maurício Pinto. Lições de Teoria Geral do Processo. 4º edição. Juruá Editora, Curitiba/PR, 1999

CORREIA, Marcus Orione Gonçalves. Teoria geral do processo. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

LEAL, Rosemiro Pereira. Teoria Geral do Processo. 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

PINTO, Davi Souza. Teoria Geral de Processo. As diferentes visões teóricas que surgiram no decorrer da história do Direito Sobre o Processo. Revista Jus Vigilantibus. Disponível em: <http://jusvi.com/artigos/35903> Acesso em: 25 set. 2012.

VIEIRA, Anderson Novaes et al. Natureza Jurídica da Ação e do ProcessoJus Navigandi. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3078>. Acesso em: 29 set. 2012.

GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO,Cândido R., CINTRA, Antônio Carlos de Araújo. Teoria Geral do Processo. 28ª edição, São Paulo: Melheiros, 2012.

SITES

 A Relação Jurídica Processual. Disponível em: <http://hc.costa.sites.uol.com.br/relacao.html> Acesso em: 26 set. 2012.

[1] Acadêmica do curso de Direito, cursando o 9º semestre na Universidade Estadual de Montes Claros. E-mail: luizacarlasantos@hotmail.com

[2] GRINOVER; DINAMARCO, CINTRA, 2012, p.279

[3] LEAL, 2010, p. 92

[4] COLUCCI, ALMEIDA, 1999, p. 124,125

[5] CORREIA, 2009, p.123

[6] GRINOVER; DINAMARCO, CINTRA, 2012, p. 277

[7] CAETANO, Luis Mário Leal Salvador. O processo como relação jurídica Disponivel em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/5887/O-processo-como-relacao-juridica>. Acesso em: 26 set. 2014.

[8] GRINOVER; DINAMARCO, CINTRA, 2012, p. 281

Dicotomia sobre a responsabilidade de pagamento do salário durante o limbo jurídico previdenciário trabalhista

Muito se questiona sobre qual o procedimento a adotar, quando um funcionário anteriormente afastado pelo INSS recebe “alta previdenciária” e, ao retornar a Empregadora, submete-se a consulta em médico do trabalho (da Empregadora) ou mesmo médico particular e é constatada sua inaptidão laboral.

Ou seja, o funcionário está apto para o trabalho pelo INSS e inapto para a Empregadora, de maneira que ele fica no “limbo jurídico previdenciário trabalhista”.

Assim, resta a dúvida de como proceder neste caso. A Empregadora recebe o empregado de volta ao trabalho ou o encaminha novamente ao INSS? Quem paga o salário do empregado?

Quando a Empregadora recebe o atestado de inaptidão do médico do trabalho ou médico particular, associado a “alta médica previdenciária”, encaminha o empregado novamente ao INSS, sendo que na maioria das vezes é indeferido o pedido de reconsideração, de maneira que o trabalhador apresenta recurso desta decisão junto ao órgão previdenciário.

É cediço que quando um funcionário é afastado por motivo de doença ou doença-acidentária, a Empregadora paga seu salário referente aos 30 (trinta)¹ primeiros dias trabalhados e após, o pagamento fica a cargo da Previdência Social.

Assim, o INSS paga o salário do obreiro até a data da “alta previdenciária”, sendo certo que, durante o período da análise do pedido de reconsideração e/ou julgamento do recurso, o percebimento do benefício é cessado.

Importante mencionar que, após a “alta médica do INSS”, a suspensão do pacto laboral deixa de existir, voltando o contrato de trabalho a produzir todos os seus efeitos.

Porém, é nesse ponto que o entendimento de nossos tribunais se divide, porquanto não há determinação legal quanto ao tema.

Em verdade, nossos Tribunais têm firmado dois posicionamentos: um versando que durante o “limbo jurídico previdenciário trabalhista” quem deve pagar o salário do funcionário é a Empregadora e outro versando que ela (Empregadora) não assume tal responsabilidade.

O entendimento que determina o pagamento pela Empregadora ao funcionário durante o “limbo jurídico previdenciário trabalhista” está baseado no fato de que a Empregadora deve remanejar o obreiro para função que não o prejudique ou agrave seu problema, sob pena de ser entendido como recusa deliberada em adaptação de nova função, de maneira que tal ato é considerado como impedimento de retorno ao labor, e neste caso, deve tal situação ser vista como se o empregado estivesse à disposição da empresa esperando ordens.

E, sendo assim, o tempo de trabalho deve ser contado e os salários e demais vantagens decorrentes do vínculo de emprego quitados pela Empregadora ao empregado, nos termos do artigo 4º da CLT.

Ainda, esse posicionamento está baseado no entendimento de que, se a Empregadora não concorda com a “alta médica previdenciária” do trabalhador, deve recorrer da decisão à Autarquia (INSS) e destruir a presunção de capacidade atestada pelo médico oficial e fazer valer a posição de seu médico, não podendo a Empregadora ficar na cômoda situação de recusa em dar trabalho e, carrear aos ombros do trabalhador uma situação de “limbo jurídico previdenciário trabalhista”, à própria sorte, sem receber salários e benefício previdenciário.

Aliás, muitos julgadores entendem que a ausência de pagamento pela Empregadora ao empregado durante o “limbo jurídico previdenciário trabalhista”, caracteriza dano moral indenizável.

Nesse sentido, em recente julgado:

“LIMBO JURÍDICO PREVIDENCIÁRIO TRABALHISTA. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR PELOS SALÁRIOS E DEMAIS VANTAGENS DECORRENTES DO VINCULO DE EMPREGO. DANO À MORAL. Após a alta médica do INSS, a suspensão do pacto laboral deixa de existir, voltando o contrato em tela a produzir todos os seus efeitos. Se o empregador impede o retorno ao labor, deve tal situação ser vista como se o empregado estivesse à disposição da empresa esperando ordens, onde o tempo de trabalho deve ser contado e os salários e demais vantagens decorrentes o vinculo de emprego quitados pelo empregador, nos termos do art. 4º da CLT. Além disso, o mero fato de ensejar ao trabalhador a famosa situação de “limbo jurídico previdenciário trabalhista” – quando o empregado recebe alta do INSS, porém ainda está inapto para o labor segundo a empresa – configura o dano à moral, posto que o trabalhador fica à mercê da própria sorte, sem meios para a própria sobrevivência e de seus dependentes”. (P. 00018981120135020261 – TRT2 – 5ª Turma – Recurso Ordinário – Des. Rel. Maurílio de Paiva Dias – publ. 09/03/2015).

Por outro lado, o entendimento contrário se escora no fato de que não há qualquer irregularidade da conduta da Empregadora diante dos documentos que atestam a inaptidão do obreiro, como o laudo do médico do trabalho de obstar seu retorno ao labor, enquanto durar o procedimento de recursos perante a Previdência Social.

Inclusive, tal entendimento é no sentido de que não há obrigatoriedade da Empregadora remunerar o empregado durante esse período, já que esse lapso temporal em que o último permanece afastado pedindo reconsideração do pedido de auxílio-doença deve ser considerado como suspensão do contrato de trabalho. Ou seja, o entendimento é no sentido de que não é possível imputar à Empregadora um encargo que não é seu.

Nesse sentido, também em recente julgado:

“AUXÍLIO-DOENÇA – ALTA DO INSS – EMPREGADA CONSIDERADA INAPTA PELO MÉDICO DA EMPRESA – IMPOSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO DE PAGAMENTO DE SALÁRIOS AO EMPREGADOR. Não houve recusa injustificada da empresa em reintegrar a obreira ao trabalho. Toda a prova documental produzida demonstra que a reclamada não agiu de má fé e cumpriu todas as suas obrigações, não exigindo da trabalhadora a prestação de serviços, por reputá-la incapaz para o trabalho e fornecendo a documentação necessária para que a reclamante pudesse pleitear seus direitos junto ao INSS (docs. nº 45/68, volume apartado). Não se constata qualquer irregularidade no procedimento patronal. O laudo pericial de fls. 152/161, inclusive, confirmou que a reclamante não está apta ao trabalho, apresentando fibromialgia, lesão crônica da coluna (discopatia degenerativa) e quadro de depressão crônica, todos sem nexo com o trabalho realizado na reclamada. Como bem salientado a quo, não há impedimento legal para que as empresas, diante dos documentos que atestam a inaptidão do obreiro, como o laudo do médico do trabalho, obstem seu retorno ao trabalho enquanto durar o procedimento administrativo de recursos perante a Previdência Social, também não há obrigatoriedade de remunerar mencionado período, já que, esse período em que o empregado permanece afastado pedindo reconsideração do pedido de auxílio-doença deve ser considerado como de suspensão do contrato de trabalho. Outrossim, não há fundamento legal para autorizar o pagamento dos salários pretendidos. Recurso ordinário da reclamante a que se nega provimento” (P. 0001364-07.2013.5.02.0087 – TRT2 – 18ª Turma – Recurso Ordinário – Des. Rel. Maria Cristina Fisch – publ. 02/03/2015).

De observar que, de fato, atualmente, o entendimento é bastante dividido, de modo que, entendo que o melhor caminho a ser adotado, quando se deparar com situações análogas, é que a Empregadora ofereça uma função ao empregado, compatível com sua capacidade, remanejando-o a tal atividade, fazendo de forma documentada.

Ainda, a fim de evitar problemas futuros, o ideal, para que a Empregadora minimize seus riscos, é que solicite que o médico do trabalho ateste que o obreiro está inapto para determinada função e apto para outra. E, ainda, se for o caso do empregado recusar-se a retornar às atividades laborais, mesmo remanejado a outra função, que envie telegrama oportunizando seu retorno a atividade compatível com a sua capacidade e/ou solicite declaração ao trabalhador, no sentido de que sua opção é pelo não retorno ao trabalho.

Até porque, remanejando o trabalhador para função compatível com a sua capacidade, os prejuízos de ambas as partes serão reduzidos, eis que a Empregadora pagará a remuneração mediante uma prestação de serviço, evitando ainda, o risco de ser condenada ao pagamento de indenização por dano moral e, de outro lado, o Trabalhador não ficará desamparado financeiramente.

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¹ Artigo 1º, §3º da Medida Provisória nº 664, de 30 de Dezembro de 2014.

Priscilla Yamamoto
Advogada do escritório Ozi, Venturini & Advogados Associados
priscilla@oziventurini.com.br

A Progressão de Regime e o Exame Criminológico à Luz da Súmula Vinculante 26 e Súmula 439 do STJ

O presente estudo não tem como escopo a análise do exame criminológico sob a ótica do princípio da secularização e do direito penal de autor ou da possibilidade (ou não) do exame para o ingresso no regime fechado. Restringe-se o tema à exigência (ou não) do exame criminológico como requisito para a progressão de regime de execução da pena.

A súmula vinculante nº 26 descreve que “Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei n. 8072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico”. Em outras palavras, a súmula narra que é possível a progressão de regime para os condenados pela prática de crime hediondo ou equiparado, desde que sejam preenchidos os requisitos subjetivos e objetivos da progressão, sendo facultativa a realização do exame criminológico.

Por sua vez, a súmula 439 do Superior Tribunal de Justiça afirma que “Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada”. Dito de outro modo, o exame criminológico não é obrigatório para a progressão do regime, mas pode ser determinada pelo Juiz, diante das peculiaridades do caso, em decisão fundamentada.

Ponto em comum nas duas súmulas supracitadas é que o exame criminológico não é obrigatório, não constituindo um requisito para a progressão da pena. Pode, no entanto, ser determinado pelo magistrado, desde que por decisão fundamentada.

Mas, o que é o exame criminológico?

Para Cezar Roberto BITENCOURT, o exame criminológico “é a pesquisa dos antecedentes pessoais, familiares, sociais, psíquicos, psicológicos do condenado, para obtenção de dados que possam revelar a sua personalidade” (Tratado de Direito Penal: parte geral. 11. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. Vol. 1. p. 459). E continua dizendo que “é uma perícia, embora a LEP não o diga, busca descobrir a capacidade de adaptação do condenado ao regime de cumprimento da pena; a probabilidade de não delinquir; o grau de probabilidade de reinserção na sociedade, através de um exame genético, antropológico, social e psicológico” (idem. P. 461).

Luiz Régis PRADO leciona que “O exame criminológico exsurge na Lei de Execução Penal como instrumento indispensável para a elaboração do programa individualizador da execução de modo a oportunizar a cada sentenciado os elementos necessários para sua reinserção social” (Comentários ao Código Penal. 5. Ed. São Paulo: RT, 2010. p. 173. nota 3).

Posto isso, resta-nos saber: o exame criminológico é requisito para a progressão de regime?

Para tanto, importante saber quais são os requisitos para a progressão do regime de execução da pena. Assim, partindo-se da premissa que “A progressão no regime de execução da pena privativa de liberdade é uma das faces visíveis da individualização da pena, que constitui um dos principio fundamentais do Direito Penal” (DOTTI, Rene Ariel. Curso de Direito Penal. 3. Ed. São Paulo: RT, 2010. p. 653) e que “A passagem para o regime menos rigoroso depende da fração de pena cumprida no regime anterior e do mérito do condenado” (idem), passamos, sem mais delongas, aos requisitos.

A progressão de regime, ou seja, a “passagem do condenado de um regime mais rigoroso para outro mais suave, de cumprimento da pena privativa de liberdade” (CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. 11. Ed. São Paulo, 2007. Vol. 1. p. 365), possui, regra geral, dois requisitos: a) objetivo ou formal e b) subjetivo ou material. A exceção refere-se ao condenado por crime contra a administração pública, que necessita, ainda um terceiro requisito, qual seja, a reparação do dano ou a devolução do produto do ilícito acrescidos de juros e atualização monetária. Focaremos na regra geral.

Sobre os requisitos da progressão, retomemos novamente a lição de Luiz Régis PRADO (Ob. Cit. p. 183, item 5.1):

Evolui o condenado progressivamente, de um regime a outro, menos severo, desde que se comprove a presença concomitante de dois requisitos básicos: o cumprimento de pelo menos um sexto da pena no regime anterior (requisito formal) e o mérito do condenado (requisito material), que é comprovado pela ostentação de bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, além de outros elementos valorados como relevantes para caracterizar o citado mérito.

Dito de outra maneira, o requisito objetivo ou formal consiste no tempo de cumprimento de pena no regime anterior, de pelo menos 1/6 do restante da pena (para crimes hediondos e equiparados, após a Lei n. 11.464/07, determinou que o tempo para progressão é de 2/3 ou 3/5 da pena). O requisito subjetivo ou material é o mérito do condenado, isto é, o bom comportamento do condenado, atestado pelo diretor do estabelecimento prisional que se encontra cumprindo a pena.

Como se pode observar, o exame criminológico não é requisito para a progressão de regime. Todavia, pode ser requerido pelo magistrado da execução, em decisão fundamentada, passível de agravo, para que seja elaborada a perícia, com a finalidade de demonstrar ou não o mérito do acusado.

Celso DELMANTO e outros (Código Penal Comentado. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 223), citando decisão do Supremo Tribunal Federal destacou, in verbis:

O sentenciado que preenche os pressupostos necessários à progressão de regime possui direito subjetivo à sua concessão, sendo facultado ao juízo das execuções criminais determinar a realização do exame criminológico, tendo em vista a singularidade do caso concreto. A exigência da perícia, contudo, deve ser motivada com esteio nas peculiaridades da causa e no comportamento carcerário do sentenciado. A gravidade abstrata do delito, dissociada de elementos concretos, per si, não é suficiente para justificar a necessidade do exame criminológico, pois não tem o condão de demonstrar as condições pessoais do condenado, tampouco seu comportamento dentro do sistema penitenciário.

Neste diapasão, eis os precedentes recentes da Suprema Corte:

EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. EXAME CRIMINOLÓGICO. LEI 10.792/03. LIVRAMENTO CONDICIONAL. PEDIDO INDEFERIDO. DECISÃO FUNDAMENTADA. ORDEM DENEGADA. 1. A questão de direito tratada neste writ diz respeito à fundamentação da decisão que indeferiu o pedido de livramento condicional do paciente baseado em exame criminológico desfavorável. 2. Esta Corte tem-se pronunciado no sentido da possibilidade de determinação da realização do exame criminológico “sempre que julgada necessária pelo magistrado competente” (AI-AgR-ED 550735-MG, rel. Min. Celso de Mello, DJ 25.04.2008). 3. O art. 112 da LEP (na redação dada pela Lei 10.792/03) não veda a realização do exame criminológico. No mesmo sentido: HC 96.660/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, DJe 21.08.2009; e HC 93.848/RS, rel. Min. Joaquim Barbosa, 2ª Turma, DJe 19.12.2008. 4. A noção de bom comportamento, tal como prevista no art. 112 da LEP (na redação dada pela Lei 10.792/03), abrange a valoração de elementos que não podem se restringir ao mero atestado de boa conduta carcerária. 5. O pedido de livramento condicional foi indeferido com fundamento em elementos concretos e específicos, que demonstram a inconveniência do benefício pleiteado e, por conseguinte, a inexistência do alegado constrangimento ilegal. 6. Habeas corpus denegado.

(STF. HC. 105.912/RS. Rel. Min. Ellen Gracie. T2. Julg. 05.04.2011. DJe 075).

HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME. EXIGÊNCIA DE EXAME CRIMINOLÓGICO PARA FINS DE PROGRESSÃO: POSSIBILIDADE, MESMO COM A SUPERVENIÊNCIA DA LEI N. 10.792/2003. EXISTÊNCIA DE DECISÃO FUNDAMENTADA. ORDEM DENEGADA. 1. Conforme entendimento firmado neste Supremo Tribunal, a superveniência da Lei n. 10.792/2003 não dispensou, mas apenas tornou facultativa a realização de exame criminológico para a aferição da personalidade e do grau de periculosidade do sentenciado. Precedentes. 2. Na linha dos precedentes deste Supremo Tribunal posteriores à Lei n. 10.792/2003, o exame criminológico, embora facultativo, deve ser feito por decisão devidamente fundamentada, com a indicação dos motivos pelos quais, considerando-se as circunstâncias do caso concreto, ele seria necessário, como se tem na espécie. 3. Ordem denegada.

(STF. HC 104.755/SP. Rel. Min. Carmen Lúcia. T1. Julg. 05.04.2011. DJe 099).

Nessa mesma linha, ainda na jurisprudência do STF, vide: HC 105.234/RS (Rel. Min. Cármen Lúcia, julg. 15.02.2011); HC 106.477/RS (Rel. Min. Dias Toffoli, julg. 01.02.2011); HC 102.859/SP (Rel. Min. Joaquim Barbosa, julg. 07.12.2010); HC 105.123 (Rel. Min. Gilmar Mendes, julg. 16.11.2010); HC 103.733/SP (Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julg. 26.10.2010); HC 101.997/RS (Rel. Min. Ayres Britto, julg. 14.09.2010).

O Superior Tribunal de Justiça posicionou-se no mesmo sentido, confira-se:

HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME. EXAME CRIMINOLÓGICO. DECISÃO FUNDAMENTADA. LAUDO PSICOSSOCIAL DESFAVORÁVEL. PROGRESSÃO NEGADA. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA. ORDEM DENEGADA. 1. De acordo com as alterações trazidas pela Lei n.º 10.792/03, o exame criminológico deixa de ser requisito obrigatório para a progressão de regime, podendo, todavia, ser determinado de maneira fundamentada pelo Juiz da execução, de acordo com as peculiaridades do caso. 2. Se o Tribunal, em sede de agravo em execução, confirmou a decisão monocrática de negativa da progressão, porque o laudo psicossocial apontou ainda não se encontrar o paciente pronto para o convívio social, não há ilegalidade a sanar. Precedentes. 3. Ordem denegada.

(STJ. HC. 183.574/RS. Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura. T6. Julg. 31.015.2011. DJe 08.06.2011).

CRIMINAL. HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO. LIVRAMENTO CONDICIONAL. EXAME CRIMINOLÓGICO. POSSIBILIDADE. SÚMULA N.º 439/STJ. FORMAÇÃO DO CONVENCIMENTO DO JULGADOR. GRAVIDADE GENÉRICA DOS DELITOS PRATICADOS. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. MAGISTRADO SINGULAR QUE JULGOU DESNECESSÁRIA A PERÍCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. ORDEM CONCEDIDA. I.  A nova redação do art. 112 da Lei de Execuções Penais, conferida pela Lei n.º 10.792/2003, deixou de exigir a submissão do condenado a exame criminológico, anteriormente imprescindível para fins de progressão do regime prisional e livramento condicional, sem retirar do magistrado a faculdade de requerer a sua realização quando, de forma fundamentada e excepcional, entender absolutamente necessária sua confecção para a formação de seu convencimento. Incidência da Súmula n.º 439/STJ. II. A gravidade dos delitos praticados, tomada abstratamente e por si só, sem qualquer respaldo em fatos ocorridos durante a execução penal que denotem a necessidade de submissão do apenado ao exame criminológico, não é fundamento idôneo para determinação de que seja realizado o exame pericial, tampouco sendo suficiente para denotar a periculosidade do paciente ou sua inaptidão para a obtenção de benefícios. III.  Evidenciado que o Magistrado singular não considerou necessária a submissão do réu a exame criminológico, entendendo presentes os requisitos indispensáveis à concessão do livramento condicional, não pode o Tribunal a quo sujeitar a concessão do benefício justamente à realização do referido exame, sem a devida motivação da sua necessidade. IV. Deve ser cassado o acórdão recorrido, restabelecendo-se a decisão do Juízo da Execução, que concedeu ao paciente a progressão de regime prisional e, posteriormente, o livramento condicional, sem a necessidade de sua submissão a exame criminológico. V. Ordem concedida, nos termos do voto do Relator.

(STJ. HC 179.471/SP. Rel. Min. Gilson Dipp. T5. Julg. 19.05.2011. DJe 08.06.2011).

Também são os julgados do STJ: AgRg no HC 107.252/RS (Rel. Min. Og Fernandes, julg. 19.05.2011); AgRg no HC 126.497/SP (Rel. Des. Convocado Haroldo Rodrigues, julg. 17.0.2011); HC 194.982/RS (Rel. Min. Laurita Vaz, julg. 10.05.2011); HC 167.050/SP (Rel. Des. Convocado Vasco Della Giustina, julg. 10.05.2011).

Destarte, em que pese o exame criminológico não se caracterizar como um requisito obrigatório para a progressão do regime de execução da pena privativa de liberdade do condenado, é admitida a sua realização, para formação do convencimento do juiz quanto ao mérito do réu, desde que a decisão seja fundamentada e adequada ao caso concreto.

Em suma, a súmula vinculante n. 26 e a súmula 439 do STJ vieram a uniformizar o entendimento jurisprudencial reiterado sobre a facultatividade da realização do exame criminológico para a progressão do regime. Isto é, trata-se de perícia excepcional que pode vir a servir de base para a formação do convencimento do juiz da execução quanto ao requisito subjetivo (material) do mérito do condenado, desde que fundamentada.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral. 11. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007. Vol. 1.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em www.stj.jus.br acesso em 23.06.2011.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Disponível em www.stf.jus.br acesso em 23.06.2011.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. 11. Ed. São Paulo, 2007. Vol. 1.

DELMANTO, Celso. e outros. Código Penal Comentado. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

DOTTI, Rene Ariel. Curso de Direito Penal. 3. Ed. São Paulo: RT, 2010.

PRADO, Luiz Régis, Comentários ao Código Penal. 5. Ed. São Paulo: RT, 2010.

Helio Anjos Ortiz Neto
Auditor do Tribunal de Justiça Desportiva do Paraná
Advogado Criminal- ORTIZ ADVOCACIA – Pos Graduado em Direito Penal Processo Penal e Criminologia pela Unicuritba
Pos graduando em Direito Penal Econômico pela Universidade Positivo
heliosn3@hotmail.com

A subsunção e o ato jurídico perfeito: explanação acerca das súmulas contra legem

Resumo                                       

Prestar ou emprestar uma definição ao direito é o mesmo que buscar descrever o seu próximo: é ter ciência e consciência de si próprio até o outro – Fleuma pelo outro e paixão pelo direito. Paixão, que etimologicamente não se encontra exclusivamente ligada ás coisas que nos envolvem, mas também a tudo que nos inquieta; da qual arriscamos concluir ser o direito uma ciência apaixonante…

É razoável que o direito enquanto percepção de equilíbrio, exercício da ética e esperança de justiça permaneça na ideologia do dever ser, tornando legítima toda e qualquer medida capaz de prover consenso. Inviolável, no entanto, é “aquele” para o qual o raciocínio não encontre controvérsias na busca incessante de não rotular, perante sugestionado leque juridicamente farto. De modo inverso, contrário senso, o cuidado de não igualar injustamente os róis da tipificação bem como a eficácia á leis vigentes e em desuso, se sobreveríam dignas; caso façam-se inquestionáveis.

Objetivamos com o presente artigo ressaltar no direito o que nele se extrai de melhor: Uma ciência justa, pautada no princípio da isonomia, tendo como primado “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que se desigualem” ² (grifo nosso)Parece-nos oportuno fazer alusão ás súmulas, com especial atenção á aquelas enquadradas como verdadeiramente contra legem que a priori, surtem mais eficazes ao judiciário – não necessariamente á justiça.

Perante a necessidade de prover a uniformidade dos julgados e alcançar maior segurança jurídica, sem deixar de atender ao preceito do Art 5°,II,CF que tem na lei o seu principal fundamento, torna-se impreterível a sua análise sob a ótica penal já que na prática as súmulas vieram a assumir um caráter um tanto imediatista, servindo de fundamento á última palavra a cerca da decisão.  A adoção á súmula, no entanto, não extirpa a possibilidade que decisões contra legem permaneçam validamente no mundo jurídico, pelo contrário; poderá servir de fator multiplicador de injustiças, retirando do direito a sua especificidade.

Palavras chave: Hermenêutica. Súmulas. Súmulas contra legem no direito penal.

1-Introdução; 1.2-Súmulas: Ponderação e instrução para esses instrumentos; 1.3-Quando a lei vai contra o direito.

Introdução

Diante das mais variadas polêmicas as quais pode o direito suscitar – característica de uma ciência rica da qual a abrangência não se exime e cuja eficácia fraciona no tempo, refutada quando incompatível com a realidade social – quiçá questionável; uma vez “criadas por homens e não deuses”, faz necessárias tais indagações; arrebatadas pela compreensão e mais precisamente pela intenção da lei.

Estaríamos livres a optar pela mens legis ou mens legislatoris? Fazer da lei um legítimo instrumento de transformação social, buscando nela calçar a efetividade a que se presta, incorreria a infração de algum artigo?O que restaria pensar, no que toca as leis á luz de sua época que se aplicadas hoje, soariam ridículas? Qual a conseqüência jurídica da aplicação da norma diante tamanha inflação legislativa?

O que se espera, é que o resultado da aplicação de determinada norma conduza a resultados moralmente desejáveis, satisfazendo uma pretensão de justiça. Se é certo que o legislador não utiliza a palavra em vão, é aceitável que perante uma sociedade pluralista como a moderna, entre a vontade da lei e a do legislador prevaleça a vontade da lei; sendo este, o entendimento da majoritária doutrina. Diante disso, estaríamos sucumbe a ânimos?

Pergunto: Retirar o humanismo do direito sob o argumento de que somos todos falíveis, faz de nossa controvérsia algo libertino? Tornar o caso concreto absoluto e exteriorizado faria “fincar os pés” ao absolutismo da escandalosa França do século XVIII, tornando o processo mera formalidade?

No mais das vezes o direito tem nos mostrado nas suas diversas searas, mecanismos pelos quais se possa alcançar a verdade, quer pelo fato de muitas das relações jurídicas por terem de atender aos ditames legais e desejando burlá-las, vem a sedimentar-se sob uma falsa chancela (o uso do princípio da primazia no que toca ás relações jurídicas); quer porque o crime evolui junto com a lei; exigindo da integração um maior esforço, com a ressalva, ás penas que descrevem crimes e impõe sanções.

Lembro a vocês que é vedada a analogia em direito penal; razão pela qual nos deparamos com a chamada norma penal em branco. Não se entende afastavel em nenhum momento, sob nenhuma hipótese o primado da legalidade, pois como reza o Art 5°,II,CF:

Art 5°,II,CP – Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei.

Súmulas: Ponderação e instrução para estes instrumentos.

As súmulas ganham destaque ao buscar refrear a discricionariedade interpretativa passível de toda a lei; melhor dizendo, o tratamento ao direito material apreciado de forma divergente nas câmaras e tribunais superiores; “em bolsa de mulher e cabeça de juiz nunca se sabe o que vai sair”- não é assim que diz o ditado popular? Parecem laborar para a efetiva justiça e há de entender ter seu fim, todo o escárnio voltado á visão elitista reservada ao judiciário, já que  oportunamente se fazem mantedoras do controle de constitucionalidade de determinada matéria.

Conhecidas como jurisprudência, podem ser descritas como o conjunto de decisões, sendo entendidas como a linha que um determinado tribunal segue para tratar de um tema específico. Diferem-se das orientações jurisprudências (mais simples e atinentes á seara trabalhista) Uma vez editadas, sua alteração ou cancelamento se dará por um processo muito mais aprofundado no tribunal onde se originou.

A polêmica que rodeia a edição das súmulas se dá pelo fato de ordenamentos jurídicos complexos apresentarem vez ou outra, conflitos entre normas ou entre normas e princípios; e nesse caso, quando vencida, algumas delas se realizariam em detrimento da lei, sobrevindo súmulas inconstitucionais denominadas “contra legem”.

Embora idealizadas desde a década de 60, ainda hoje repercutem discussões sobre a possibilidade de tornarem-se ou não objeto de ADI. Cada vez mais presentes e com a mesma atenção que se dá a uma norma; ainda que não lhe seja dado o caráter jurídico de uma norma, não lhes são cabíveis argüições de descumprimento de preceito fundamental, pois lhes carece caráter normativo, conforme resolução da ADPF n° 80 julgada pelo Supremo.– Somente os legitimados que constam do artigo 3º da Lei 11.417/2006, é que podem propor a sua edição e o seu cancelamento.

Quando vinculantes, após a aprovação por no mínimo oito ministros e a publicação no Diário de Justiça Eletrônica, criadas pela Emenda Constitucional (EC) 45/04,dentre tantas outras melhorias, são atinentes á questões examinadas nas instâncias inferiores e terão o condão de tornar obrigatória a sua aplicação, pacificando o seu entendimento e servindo de veto á subsunção do juiz – embora defendam o que o ato jurídico perfeito sequer fora violado, conforme redação da supramencionada Emenda, a qual é regulamentada pela referida lei  11.417/2006 :

[…]“terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica” (parágrafo 1o do artigo 103-A).

O caso concreto seria aquele sumulado, bastando por si só o seu enquadramento.

Se o direito já repousa vinculado, não mais se produz o direito, a sentença teria por tanto um aspecto caricativo, não mais será possível alterar a maneira como se interpreta e se aplica uma lei, o que limitará a interposição de recursos. No entanto, quando elas beneficiam, todos os ramos do direito vão buscar sua validade no direito constitucional. Vai gerar a coisa julgada, terá seus efeitos erga omnes e porque não dizer, retroativos – se satisfeita talvez a única exceção em direito penal: o príncípio in bonan partem, a retroatividade, quando em benefício do réu.

São poucos os julgamentos anulados por conta da retroatividade da lei no que toca ao uso de algemas. Não nos parece cabível que centenas de julgamentos sejam decretados nulos; validado os seus efeitos, mas deixam-nos  á margem de questionar a  sua conveniência. De qualquer forma, uma vez uniformizados, ainda que não se discuta a justiça da decisão, a celeridade estaria mais próxima de ser alcançada e o senso de justiça bastaria preenchido.

1.3 “Quando a lei vai contra o direito”                                 

As súmulas não são leis, mas é necessário que se compreenda que há súmulas capazes de ir contra o direito com a mesma inércia que uma ação realiza uma norma.Tomemos como exemplo as súmulas sem efeito vinculantes.

Importante lembrar que respondendo o agente na medida de sua culpabilidade, sendo o  direito algo especifico, consequentemente variável e relativo por tanto; cujo molde se realiza através da subsunção do Juiz; a adoção facultativa pelo magistrado (cuja inobservância faz pensar ter o juiz o respaldo no Art. 5 LINDB  promovendo a justiça para atingir ao fim social e as exigências do bem comum), remete-nos áTeoria do Direito de Ronald Dworkin para a chamada Textura Aberta do Direito.

Poderá o juiz decidir diferente, adotando ou não a súmula, levando ou não o fato ao STJ, levando ou não ao Supremo e, de alguma forma, o direito e a liberdade das pessoas restaria cerceado.  A idéia não é trazer críticas a ratio penal, mas ressaltar a sua finalidade qual seja, a uniformização dos julgados.  Qual é a distancia, o discernimento, a linha tênue da qualidade do que lhe é facultativo e discricionário? E qual é a conseqüência, juridicamente falando?

São minoria as súmulas ditas contra legem em direito penal, súmulas estas que podem ser aplicadas com a maior tranquilidade pelos tribunais. Pouquíssimas, se comparadas dentre as várias 736 aplaudidas súmulas, distribuídas em suas diferentes justiças. Todos os tribunais possuem súmulas ou enunciados as quais atendem por um número sequencial. Digo que são poucas, mas friso que são várias – e isso ofende; fere a legalidade.

Importante lembrar que em se tratando de direito penal, o agente sempre responderá na medida de sua culpabilidade. Razão pela qual fora afastada do ordenamento a teoria da imputação objetiva, que atinha-se somente ao resultado final, sem levar em conta o nexo de causalidade. Logo, se o agente desferisse 6 (seis) tiros contra a vítima e a mesma viesse a falecer por conta do desabamento do teto do hospital em que se instalara, o mesmo ficaria impune – ainda que notória a intenção de matar, pois a causa da morte não seria em razão dos tiros desferidos contra ela e sim o traumatismo craniano provocado pela ação do desabamento.

Atendo-se somente ao resultado exposto por essa teoria, aquele que concorresse para o crime, mas o fizesse perante atividade lícita, ex- assar um bolo com uma faca em seu interior, também ficaria impune, uma vez que assar um bolo é uma atividade lícita, não configurando crime. Por razões óbvias, essa teoria fora definitivamente superada. –

É necessário ponderar que perante as mais variadas formas pelas quais o ius puniendi tem se incorporado no decorrer da história e evoluído, no que toca aos suplícios e as penas corpóreas – o desafio de manter-se em equilíbrio ainda é uma realidade em épocas de população carcerária, a considerarmos “ser os poderes independentes e harmônicos entre si”. Essas reformas tão aludidas e comentadas das quais hoje mais do que normas ou princípios, conflitam valores, imputam-nos no esforço de conceituá-las.

Se a impunidade choca, o esperado é que seu exagero provoque semelhante furor (pelo menos em um estado democrático de direito) e por isso, atendendo ao princípio da razoabilidade, iniciaremos fazendo menção á súmula n° 610 do Supremo no que toca ao crime de latrocínio:

STF Súmula n° 610- Há crime de latrocínio quando o homicídio se consuma ainda que não realize o agente a subtração dos bens da vítima.

Sabemos que o latrocínio é um crime complexo, realizado pela ação de roubo (art 157 CP) qualificado pelo resultado morte (Art 121CP). A lei fora revogada? Não. Crimes de homicídio e latrocínio atendem a mesma execução? Não. O tratamento punitivo para ambos os tipos de crime é o mesmo? Definitivamente não!

A adoção a essa súmula além de ferir o princípio da legalidade, parece contrariar por completo o Art.14 CP, que caracteriza o crime consumado quando realizados todos os elementos de sua definição legal, quais sejam, a subtração e o resultado morte; caso contrário, estaríamos diante de um crime tentado ou somente um homicídio.

Notem que com a edição da referida súmula o ilícito penal configurado no Art.157 CP fora suprimido, “transtornando” o tipo penal. Sendo assim, um crime contra o patrimônio passaria a ser considerado um crime contra a vida. Seria esse crime levado a júri? A resposta é não.

STJ Súmula nº 174 – no crime de roubo, a intimidação com arma de brinquedo autoriza o aumento de pena.

Não se pretende discutir a genuinidade de sua criação. Não é preciso descrever o que é medo, nem necessário explicar a violência e submissão que o medo impõe.  Devemos nos ater para as conseqüências de sua aplicação que é o aumento de pena.

Não se pode confundir uma arma com um brinquedo pela simples razão de que armas de brinquedo não matam.  O que “fizeram” com a teoria finalista da Ação que considera primordialmente a intenção do agente? De um lado a intenção de fundado temor, de outro… Não trataria este de um crime impossível?Ao analisar a justiça que esta súmula pretendia alcançar, perguntamos: sob a ótica de quem? A doutrina criticou em peso e a citada súmula teve seu cancelamento no ano de 2000.

STJ Súmula n° 231 – A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal. –

Sabemos que diante a dosimetria da pena, a pena base que não tem quantun de lei, não poderá ir além (acima) ou aquém (abaixo) da escala penal. Caberá ao juiz decidir, diante as circunstâncias Judiciais, as circunstâncias legais, bem como as causas de aumento e diminuição de pena, valorar e fixar a pena mediante a análise criteriosa e específica perante o caso concreto, sendo a conduta do agente (que atenderá a critérios etários, psíquicos e sociais, antes, durante e após o crime) fundamental e determinante. O direito como resultado meio, nunca como resultado fim.

Vejamos por exemplo o cometimento de um furto simples, cuja escala penal estabelece pena de 1 a 4 anos. Um furto simples praticado sem violência, cuja a lei permite, satisfeitos tais requisitos, a possibilidade de um hipotético arrependimento posterior e, nesse caso, a redução da pena ( Art 16 CP) que ao reparar o dano tornaria este crime de formal um crime de mera conduta e que, tendo o agente menos de 21 anos, serviria de fator ensejador a uma atenuante. – Esse é o raciocínio.

Surge o entendimento do STJ ao editar uma “súmula fim” que escandalosamente põe fim ao que reza o Art. 65 CP ao ignorar as várias enumeradas causas que sempre atenuam a pena, como já pretendera demonstrar o legislador, a evitar que o direito venha a recair sobre determinada clientela. Notem a mácula ao sistema trifásico. Súmula elitista, indiscutivelmente contra-legem.

STF Súmula n° 11- Uso de Algemas, restrições, Responsabilidades do Agente e do Estado – Nulidades

Súmula vinculante que talvez seja a mais atacada, a que mais provoque celeumas, quer em sua defesa quer em sua crítica, quer pela reação do réu, quer porque a mídia a noticie como constrangedora usurpando do direito, conclusões fundadas como ofensivas ao princípio da dignidade da pessoa humana. Acusam seu estereótipo, contestam seus estigmas, aludindo a uma justiça ora repressora, – o agente incapacitado de se mover, preso antes mesmo da sentença…um escândalo!  Ora debochada, o agente cruzando os braços e estufando o peito, rindo, acenando, livre para atuar dolosamente contra o juiz, caso queira, se condenado, quando perigoso…um absurdo!

O Entendimento é íngreme, pois não se pode algemar, restando feridos princípios constitucionais, ainda que em respeito á coletividade que em tese, prevaleceria, o que poria abaixo o in dúbio pro réu, além de influenciar o júri, que no mais das vezes gera a coisa material julgada. A revisão criminal é a exceção e o direito pode sim balizar-se em excludentes, não devendo nunca desviar-se.  A presunção da inocência é estabelecida como regra para a prática de determinado delito e deve ser observada ao acusado, sendo um princípio de ordem constitucional.

Art. 5° LVII, CF –  Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Expostas tais divergências, deixamos sob a égide do direito a súmula em seu aspecto reformador, não inquisidor. Que sejam elas capazes de arrancar críticas, sinal de que o direito possa ainda repousar unânime, clamado e reclamado, reformulado e urgente. A intenção não é revelar um fim ou desvendar uma finalidade, é respeitar a súmula com a cautela que exige -cientes de sua força, com a observância á inevitável e influente volúpia que ao homem sempre se consome, como característica.

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BIBLIOGRAFIA

[1]CELSO RIBEIRO BASTOS, Curso de Direito Constitucional, São Paulo, Saraiva, 1978, p.225.

Dworkin Ronald, Levando o direito a Sério.1° Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 1980.

Paulo, Digesta, 22.3.2

Rogério Greco, A evolução do direito penal, disponível aqui.

Toledo, Francisco de Assis. Princípios básicos de Direito Penal. 5° Ed.São Paulo: São Paulo

Érika Barion Bacellar
Acadêmica do 8 período do Curso de Direito pela Faculdade de Ciências e Letras Dr. Edmundo Ulson – UNAR
erikabarbac@yahoo.com.br