Reforma da Previdência: Contribuições dos Servidores e dos Segurados

A Previdência Social teve alterações em decorrência da publicação da Emenda Constitucional n. 103 em 13 de novembro de 2019, alcançando as contribuições previdenciárias e suas alíquotas. 

As mudanças proporcionadas pela EC 103/2019 não interferiram, inicialmente, nas regras para os servidores públicos estaduais e municipais, segurados do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS).

No entanto, mudaram as regras dos benefícios para os servidores públicos federais e para os beneficiários do Regime Geral da Previdência Social (RGPS).

Foram determinadas, ainda, regras próprias para os Policiais Militares, Bombeiros, trabalhadores rurais e professores.

A Constituição Federal dispõe no artigo 40 sobre a natureza do RPPS, que é contributiva e solidária, como se lê:

O regime próprio de previdência social dos servidores titulares de cargos efetivos terá caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente federativo, de servidores ativos, de aposentados e de pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial.

Entretanto, o §21 do referido artigo foi revogado, ele discorria sobre a incidência da contribuição previdenciária sobre as aposentadorias e pensões decorrentes de doenças incapacitantes.

A competência para criação de contribuições sociais está prevista na CF, no artigo 149, onde consta:

Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.

Já os parágrafos 1º, A, B e C do dispositivo mencionado, todos incluídos pela EC 103/2019, tratam da competência para criação das contribuições que mantém o RPPS e dispõem:

  • 1º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, por meio de lei, contribuições para custeio de regime próprio de previdência social, cobradas dos servidores ativos, dos aposentados e dos pensionistas, que poderão ter alíquotas progressivas de acordo com o valor da base de contribuição ou dos proventos de aposentadoria e de pensões.
  • 1º-A. Quando houver deficit atuarial, a contribuição ordinária dos aposentados e pensionistas poderá incidir sobre o valor dos proventos de aposentadoria e de pensões que supere o salário-mínimo.
  • 1º-B. Demonstrada a insuficiência da medida prevista no § 1º-A para equacionar o deficit atuarial, é facultada a instituição de contribuição extraordinária, no âmbito da União, dos servidores públicos ativos, dos aposentados e dos pensionistas.
  • 1º-C. A contribuição extraordinária de que trata o § 1º-B deverá ser instituída simultaneamente com outras medidas para equacionamento do deficit e vigorará por período determinado, contado da data de sua instituição.

Da análise se extrai a possibilidade de instituição de alíquotas progressivas, desde que por lei. Ainda, restou estabelecido que possam incidir contribuições ordinárias sobre aposentadorias e pensões acima do salário-mínimo em caso de déficit. 

E, em não sendo suficiente a contribuição ordinária, ficou destacado que poderá ser instituída contribuição extraordinária.

Na mesma linha, dispõe o artigo 9º, §4º, da EC 103 que:

Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão estabelecer alíquota inferior à da contribuição dos servidores da União, exceto se demonstrado que o respectivo regime próprio de previdência social não possui deficit atuarial a ser equacionado, hipótese em que a alíquota não poderá ser inferior às alíquotas aplicáveis ao Regime Geral de Previdência Social.

Em que pese a leitura do artigo demonstre, inicialmente, a impossibilidade de a alíquota dos Estados, do Distrito federal e dos Municípios ser inferior à atribuída aos servidores da União, consta a exceção, que, de todo modo, aponta que a alíquota não poderá ser inferior àquelas do RGPS.

A alíquota do RPPS está disposta no artigo 11 da EC, que expõe que “Até que entre em vigor lei que altere a alíquota da contribuição previdenciária de que tratam os arts. 4º, 5º e 6º da Lei nº 10.887, de 18 de junho de 2004, esta será de 14 (quatorze por cento)”.

Essa alíquota, na forma do §1º, é reduzida ou aumentada a depender do valor de contribuição ou do benefício, de acordo com os parâmetros dispostos nos incisos I a VIII do mesmo parágrafo.

No inciso I consta a redução de 6,5% para o segurado que recebe até 1 salário-mínimo, resultando na alíquota de 7,5%.

Para os demais incisos foi publicada a Portaria n. 2.963, de 3 de Fevereiro de 2020, da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, que determina as reduções nos incisos II a IV, conforme segue:

II – acima de 1 (um) salário-mínimo até R$ 2.089,60 (dois mil, oitenta e nove reais e sessenta centavos), redução de cinco pontos percentuais;

III – de R$ 2.089,61 (dois mil, oitenta e nove reais e sessenta e um centavos) até R$ 3.134,40 (três mil, cento e trinta e quatro reais e quarenta centavos), redução de dois pontos percentuais;

IV – de R$ 3.134,41 (três mil, cento e trinta e quatro reais e quarenta e um centavos) até R$ 6.101,06 (seis mil, cento e um reais e seis centavos), sem redução ou acréscimo;

As alíquotas majoradas estão determinadas pela mesma Portaria nos incisos V a VII, que dispõem:

V – de R$ 6.101,07 (seis mil, cento e um reais e sete centavos) até R$ 10.448,00 (dez mil, quatrocentos e quarenta e oito reais), acréscimo de meio ponto percentual;

VI – de R$ 10.448,01 (dez mil, quatrocentos e quarenta e oito reais e um centavo) até R$ 20.896,00 (vinte mil, oitocentos e noventa e seis reais), acréscimo de dois inteiros e cinco décimos pontos percentuais;

VII – de R$ 20.896,01 (vinte mil, oitocentos e noventa e seis reais e um centavo) até R$ 40.747,20 (quarenta mil, setecentos e quarenta e sete reais e vinte centavos), acréscimo de cinco pontos percentuais; e

VIII – acima de R$ 40.747,20 (quarenta mil, setecentos e quarenta e sete reais e vinte centavos), acréscimo de oito pontos percentuais.

A Portaria entrou em vigor em 04 de fevereiro de 2020 e produz efeitos desde 1º de março de 2020.

Este artigo é de autoria de Elen Moreira e realizado em parceria com o Instituto Direito Real. Elen é advogada especialista em Direito Público. Conciliadora e colaboradora do CEJUSC/TJSC. Representante da OAB/SC – 23ª Subseção no Conselho Municipal de Saúde e Membro da Comissão de Políticas de Combate às Drogas.

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Dicotomia sobre a responsabilidade de pagamento do salário durante o limbo jurídico previdenciário trabalhista

Muito se questiona sobre qual o procedimento a adotar, quando um funcionário anteriormente afastado pelo INSS recebe “alta previdenciária” e, ao retornar a Empregadora, submete-se a consulta em médico do trabalho (da Empregadora) ou mesmo médico particular e é constatada sua inaptidão laboral.

Ou seja, o funcionário está apto para o trabalho pelo INSS e inapto para a Empregadora, de maneira que ele fica no “limbo jurídico previdenciário trabalhista”.

Assim, resta a dúvida de como proceder neste caso. A Empregadora recebe o empregado de volta ao trabalho ou o encaminha novamente ao INSS? Quem paga o salário do empregado?

Quando a Empregadora recebe o atestado de inaptidão do médico do trabalho ou médico particular, associado a “alta médica previdenciária”, encaminha o empregado novamente ao INSS, sendo que na maioria das vezes é indeferido o pedido de reconsideração, de maneira que o trabalhador apresenta recurso desta decisão junto ao órgão previdenciário.

É cediço que quando um funcionário é afastado por motivo de doença ou doença-acidentária, a Empregadora paga seu salário referente aos 30 (trinta)¹ primeiros dias trabalhados e após, o pagamento fica a cargo da Previdência Social.

Assim, o INSS paga o salário do obreiro até a data da “alta previdenciária”, sendo certo que, durante o período da análise do pedido de reconsideração e/ou julgamento do recurso, o percebimento do benefício é cessado.

Importante mencionar que, após a “alta médica do INSS”, a suspensão do pacto laboral deixa de existir, voltando o contrato de trabalho a produzir todos os seus efeitos.

Porém, é nesse ponto que o entendimento de nossos tribunais se divide, porquanto não há determinação legal quanto ao tema.

Em verdade, nossos Tribunais têm firmado dois posicionamentos: um versando que durante o “limbo jurídico previdenciário trabalhista” quem deve pagar o salário do funcionário é a Empregadora e outro versando que ela (Empregadora) não assume tal responsabilidade.

O entendimento que determina o pagamento pela Empregadora ao funcionário durante o “limbo jurídico previdenciário trabalhista” está baseado no fato de que a Empregadora deve remanejar o obreiro para função que não o prejudique ou agrave seu problema, sob pena de ser entendido como recusa deliberada em adaptação de nova função, de maneira que tal ato é considerado como impedimento de retorno ao labor, e neste caso, deve tal situação ser vista como se o empregado estivesse à disposição da empresa esperando ordens.

E, sendo assim, o tempo de trabalho deve ser contado e os salários e demais vantagens decorrentes do vínculo de emprego quitados pela Empregadora ao empregado, nos termos do artigo 4º da CLT.

Ainda, esse posicionamento está baseado no entendimento de que, se a Empregadora não concorda com a “alta médica previdenciária” do trabalhador, deve recorrer da decisão à Autarquia (INSS) e destruir a presunção de capacidade atestada pelo médico oficial e fazer valer a posição de seu médico, não podendo a Empregadora ficar na cômoda situação de recusa em dar trabalho e, carrear aos ombros do trabalhador uma situação de “limbo jurídico previdenciário trabalhista”, à própria sorte, sem receber salários e benefício previdenciário.

Aliás, muitos julgadores entendem que a ausência de pagamento pela Empregadora ao empregado durante o “limbo jurídico previdenciário trabalhista”, caracteriza dano moral indenizável.

Nesse sentido, em recente julgado:

“LIMBO JURÍDICO PREVIDENCIÁRIO TRABALHISTA. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR PELOS SALÁRIOS E DEMAIS VANTAGENS DECORRENTES DO VINCULO DE EMPREGO. DANO À MORAL. Após a alta médica do INSS, a suspensão do pacto laboral deixa de existir, voltando o contrato em tela a produzir todos os seus efeitos. Se o empregador impede o retorno ao labor, deve tal situação ser vista como se o empregado estivesse à disposição da empresa esperando ordens, onde o tempo de trabalho deve ser contado e os salários e demais vantagens decorrentes o vinculo de emprego quitados pelo empregador, nos termos do art. 4º da CLT. Além disso, o mero fato de ensejar ao trabalhador a famosa situação de “limbo jurídico previdenciário trabalhista” – quando o empregado recebe alta do INSS, porém ainda está inapto para o labor segundo a empresa – configura o dano à moral, posto que o trabalhador fica à mercê da própria sorte, sem meios para a própria sobrevivência e de seus dependentes”. (P. 00018981120135020261 – TRT2 – 5ª Turma – Recurso Ordinário – Des. Rel. Maurílio de Paiva Dias – publ. 09/03/2015).

Por outro lado, o entendimento contrário se escora no fato de que não há qualquer irregularidade da conduta da Empregadora diante dos documentos que atestam a inaptidão do obreiro, como o laudo do médico do trabalho de obstar seu retorno ao labor, enquanto durar o procedimento de recursos perante a Previdência Social.

Inclusive, tal entendimento é no sentido de que não há obrigatoriedade da Empregadora remunerar o empregado durante esse período, já que esse lapso temporal em que o último permanece afastado pedindo reconsideração do pedido de auxílio-doença deve ser considerado como suspensão do contrato de trabalho. Ou seja, o entendimento é no sentido de que não é possível imputar à Empregadora um encargo que não é seu.

Nesse sentido, também em recente julgado:

“AUXÍLIO-DOENÇA – ALTA DO INSS – EMPREGADA CONSIDERADA INAPTA PELO MÉDICO DA EMPRESA – IMPOSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO DE PAGAMENTO DE SALÁRIOS AO EMPREGADOR. Não houve recusa injustificada da empresa em reintegrar a obreira ao trabalho. Toda a prova documental produzida demonstra que a reclamada não agiu de má fé e cumpriu todas as suas obrigações, não exigindo da trabalhadora a prestação de serviços, por reputá-la incapaz para o trabalho e fornecendo a documentação necessária para que a reclamante pudesse pleitear seus direitos junto ao INSS (docs. nº 45/68, volume apartado). Não se constata qualquer irregularidade no procedimento patronal. O laudo pericial de fls. 152/161, inclusive, confirmou que a reclamante não está apta ao trabalho, apresentando fibromialgia, lesão crônica da coluna (discopatia degenerativa) e quadro de depressão crônica, todos sem nexo com o trabalho realizado na reclamada. Como bem salientado a quo, não há impedimento legal para que as empresas, diante dos documentos que atestam a inaptidão do obreiro, como o laudo do médico do trabalho, obstem seu retorno ao trabalho enquanto durar o procedimento administrativo de recursos perante a Previdência Social, também não há obrigatoriedade de remunerar mencionado período, já que, esse período em que o empregado permanece afastado pedindo reconsideração do pedido de auxílio-doença deve ser considerado como de suspensão do contrato de trabalho. Outrossim, não há fundamento legal para autorizar o pagamento dos salários pretendidos. Recurso ordinário da reclamante a que se nega provimento” (P. 0001364-07.2013.5.02.0087 – TRT2 – 18ª Turma – Recurso Ordinário – Des. Rel. Maria Cristina Fisch – publ. 02/03/2015).

De observar que, de fato, atualmente, o entendimento é bastante dividido, de modo que, entendo que o melhor caminho a ser adotado, quando se deparar com situações análogas, é que a Empregadora ofereça uma função ao empregado, compatível com sua capacidade, remanejando-o a tal atividade, fazendo de forma documentada.

Ainda, a fim de evitar problemas futuros, o ideal, para que a Empregadora minimize seus riscos, é que solicite que o médico do trabalho ateste que o obreiro está inapto para determinada função e apto para outra. E, ainda, se for o caso do empregado recusar-se a retornar às atividades laborais, mesmo remanejado a outra função, que envie telegrama oportunizando seu retorno a atividade compatível com a sua capacidade e/ou solicite declaração ao trabalhador, no sentido de que sua opção é pelo não retorno ao trabalho.

Até porque, remanejando o trabalhador para função compatível com a sua capacidade, os prejuízos de ambas as partes serão reduzidos, eis que a Empregadora pagará a remuneração mediante uma prestação de serviço, evitando ainda, o risco de ser condenada ao pagamento de indenização por dano moral e, de outro lado, o Trabalhador não ficará desamparado financeiramente.

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¹ Artigo 1º, §3º da Medida Provisória nº 664, de 30 de Dezembro de 2014.

Priscilla Yamamoto
Advogada do escritório Ozi, Venturini & Advogados Associados
priscilla@oziventurini.com.br