A Lei 11.101/2005, regulou a recuperação judicial, extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária.
Referida lei, em seu artigo 6º, § 2º, estabelece que é permitido pleitear, perante o administrador judicial, habilitação, exclusão, ou modificação de créditos derivados da relação de trabalho, porém, as ações de natureza trabalhista, inclusive, as impugnações a que se refere o artigo 8º da Lei, serão processadas perante a Justiça Especializada até a apuração do respectivo crédito, o qual será inscrito no quadro-geral de credores pelo valor determinado em sentença.
Ainda, o § 5º, do artigo 6º, determina a suspensão da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, pelo prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias (§ 4º, do artigo 6º), contados do deferimento do processamento da recuperação, sendo certo que, após o decurso deste prazo, as execuções trabalhistas poderão ser normalmente concluídas, mesmo que o crédito já esteja inscrito no quadro-geral de credores.
É dizer, portanto, que a execução trabalhista pode vir a prosseguir, de forma concomitante à habilitação do crédito constituído perante o juízo da recuperação judicial.
E com isso, não haveria impedimento para que a execução prosseguisse em face dos bens da empresa e dos sócios, fazendo com que os bens de ambos viessem a ser posteriormente penhorados por determinação da Justiça Especializada.
Inclusive, o mais comum argumento para o prosseguimento da execução trabalhista em face da empresa em plano de recuperação judicial se baseia no fundamento de que o crédito trabalhista possui natureza alimentar, o que lhe confere posição superprivilegiada, até mesmo, em detrimento do crédito tributário.
O caput do artigo 186, do Código Tributário Nacional, retrata bem mencionado entendimento, ao dispor que: “…O crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for sua natureza ou o tempo de sua constituição, ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente do trabalho…”. nossos os grifos
No entanto, independentemente de ser ou não determinada a continuidade da execução pela Justiça Especializada, com a possível penhora de bens da empresa, em contrapartida, o Supremo Tribunal Federal, através da decisão proferida no RE nº 583955-RJ, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Julgamento: 28.05.2009, DJE: 28.08.2009, já se posicionou na acepção de que a execução de créditos trabalhistas contra empresa em recuperação judicial deverá prosseguir perante o Juízo onde fora aprovado o plano de recuperação judicial, uma vez que a Justiça Especializada é competente apenas para constituir o crédito em questão.
Neste sentido, confira-se a ementa da R. Decisão:
EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. EXECUÇÃO DE CRÉDITOS TRABALHISTAS EM PROCESSOS DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL COMUM, COM EXCLUSÃO DA JUSTIÇA DO TRABALHO. INTERPRETAÇÃO DO DISPOSTO NA LEI 11.101/05, EM FACE DO ART. 114 DA CF. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E IMPROVIDO. I – A questão central debatida no presente recurso consiste em saber qual o juízo competente para processar e julgar a execução dos créditos trabalhistas no caso de empresa em fase de recuperação judicial. II – Na vigência do Decreto-lei 7.661/1945 consolidou-se o entendimento de que a competência para executar os créditos ora discutidos é da Justiça Estadual Comum, sendo essa também a regra adotada pela Lei 11.101/05. III – O inc. IX do art. 114 da Constituição Federal apenas outorgou ao legislador ordinário a faculdade de submeter à competência da Justiça Laboral outras controvérsias, além daquelas taxativamente estabelecidas nos incisos anteriores, desde que decorrentes da relação de trabalho. IV – O texto constitucional não o obrigou a fazê-lo, deixando ao seu alvedrio a avaliação das hipóteses em que se afigure conveniente o julgamento pela Justiça do Trabalho, à luz das peculiaridades das situações que pretende regrar. V – A opção do legislador infraconstitucional foi manter o regime anterior de execução dos créditos trabalhistas pelo juízo universal da falência, sem prejuízo da competência da Justiça Laboral quanto ao julgamento do processo de conhecimento. VI – Recurso extraordinário conhecido e improvido. nossos os grifos
Corroborando o mesmo entendimento, o Superior Tribunal de Justiça assim decidiu, verbis:
PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO RECEBIDO COMO AGRAVO REGIMENTAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO TRABALHISTA E JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PROSSEGUIMENTO DAS EXECUÇÕES TRABALHISTAS APÓS A FASE DE ACERTAMENTO E LIQUIDAÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO UNIVERSAL DA RECUPERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RETOMADA AUTOMÁTICA DAS EXECUÇÕES APÓS O FIM DO PRAZO DE 180 DIAS. NÃO CABIMENTO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que, ultrapassada a fase de acertamento e liquidação dos créditos trabalhistas, cuja competência é da Justiça do Trabalho, os valores apurados deverão ser habilitados nos autos da falência ou da recuperação judicial para posterior pagamento (Decreto-Lei 7.661/45; Lei 11.101/2005). 2. O entendimento desta Corte preconiza que, via de regra, deferido o processamento ou, posteriormente, aprovado o plano de recuperação judicial, é incabível a retomada automática das execuções individuais, mesmo após decorrido o prazo de 180 dias previsto no art. 6º, § 4º, da Lei 11.101/2005. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ – RCD no CC 131894 SP 2013/0414833-7 – Relator: Min. Raul Araújo – Julgamento: 26/02/2014 – Órgão Julgador: S2 – Segunda Seção – Publicação: DJE 31/03/2014). nossos os grifos
Sendo assim, não há como a execução do crédito líquido trabalhista se processar na Justiça Especializada, quando a legislação ordinária estabeleceu um juízo coletivo de credores, incluindo-se o credor trabalhista, ressalvada, entretanto, a particularidade de satisfação do crédito, no que diz respeito a prazo para recebimento, valor, ordem de pagamento, etc.
Conclui-se, portanto, respeitando-se a individualidade de cada caso concreto, que se o crédito trabalhista líquido se encontrar habilitado e devidamente homologado pelo Juízo da recuperação judicial, é evidente que o mesmo deverá ser satisfeito por este último, nas formas e condições previstas na Lei 11.101/2005.
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Dra. Gislane Setti Carpi de Moraes
Advogada da Ozi, Venturini & Advogados Associados