No dia 13 de setembro de 2017, o humorista Paulo Gustavo anunciou que ele e o marido, o dermatologista Thales Bretas, serão pais de um casal de gêmeos. O anúncio feito pelas redes sociais do casal reacendeu o debate em torno da lei de barriga de aluguel no Brasil.
Como o país tem regras muito específicas para o uso da gravidez por substituição, os bebês do ator que ficou conhecido por levar milhões de pessoas ao cinema ao interpretar Dona Hermínia nos filmes “Minha mãe é uma peça” e “Minha mãe é uma peça 2” foram gerados e passarão toda a gestação nos Estados Unidos.
Continue a leitura e entenda quais são os aspectos legais que devem ser observados no uso do procedimento no Brasil.
A lei sobre barriga de aluguel no Brasil
Na verdade não há uma lei sobre o tema em vigor no Brasil. O que há são resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Provimento nº 52/2016 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Os dois instrumentos infralegais tratam da chamada gravidez por substituição, que pode ser popularmente chamada de barriga solidária.
O próprio termo barriga de aluguel, no Brasil, não deve ser usado, justamente porque o ponto central da Resolução 2121/2015 do CFM, diz que “a doação temporária do útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial”. Como se sabe, o contrato de aluguel pressupõe o pagamento em contrapartida ao usufruto de bem móvel ou imóvel.
Ao tratar da doação temporária do útero, a resolução do Conselho Federal de Medicina destacou “que clínicas, centros ou serviços de reprodução assistida podem usar técnicas de RA (reprodução assistida), desde que exista um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética ou em caso de união homoafetiva”.
Um dos pontos que devem ser observados é que “as doadoras temporárias do útero devem pertencer à família de um dos parceiros em parentesco consanguíneo até o quarto grau”.
Isso significa dizer que só podem ceder a barriga solidária as mães (primeiro grau), irmãs ou avós (segundo grau), tias (terceiro grau) e primas (quarto grau). Nos demais casos, é preciso da autorização expressa do Conselho Regional de Medicina.
Essa obrigatoriedade de que a doadora temporária do útero seja parente de até quarto grau dialoga com a Lei 9.434/1997, que dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento.
A referida legislação diz em seu artigo 9º que “é permitida à pessoa juridicamente capaz dispor gratuitamente de tecidos, órgãos e partes do próprio corpo vivo, para fins terapêuticos ou para transplantes em cônjuges ou parentes consanguíneos até o quarto grau”.
No caso do procedimento de reprodução assistida que consiste no uso da barriga solidária, os futuros pais fornecem o material genético necessário (espermatozoides e óvulos), que serão fertilizados in vitro e, posteriormente, implantados no útero da mulher que cederá temporariamente o útero para a gestação.
No caso de casais homoafetivos, pela inexistência de um dos dois materiais necessários exigidos, o procedimento é necessariamente diferente. Se o casal for composto por duas mulheres, será necessário recorrer a um banco de sêmen para a fertilização in vitro. No caso de casais do sexo masculino, haverá a necessidade de se recorrer a um banco de óvulos. Nesta situação, a doadora deverá, obrigatoriamente, ser anônima, não podendo ser parente e, ao mesmo tempo, sendo voluntária.
Os documentos exigidos para o procedimento
Um advogado que for procurado por um casal interessado em utilizar a barriga solidária deve estar atento aos documentos que serão exigidos e que estão constantes na Resolução 2.121/2015 do CFM.
Entre eles estão termos de consentimento que tratará de aspectos biopsicossociais, riscos envolvidos durante o ciclo gestacional e puerperal e questões legais afeitas à filiação.
Também deve ser produzido um relatório médico com o perfil psicológico, atestando a adequação clínica e emocional de todos os envolvidos.
Serão dadas as garantias de tratamento e acompanhamento médico à mãe que doará temporariamente o útero, até o puerpério e do registro civil da criança pelos pais genéticos. Também é exigida a aprovação do cônjuge ou companheiro, caso a doadora do útero seja casada ou viva em união estável.
A segurança jurídica do procedimento
Todas essas exigências buscam dar segurança jurídica a um procedimento que não está claramente previsto na lei.
Para ampliar tal segurança, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tratou do assunto no Provimento 52/2016, editado em 14 de março de 2016, sob a gestão da então corregedoria, ministra Nancy Andrighi.
O ato administrativo dispõe sobre o registro de nascimento e emissão da respectiva certidão dos filhos nascidos por reprodução assistida no Brasil.
No parágrafo 1º do artigo 1º, o provimento trata dos documentos exigidos no caso de doação voluntária de gametas ou de gestação por substituição e, no parágrafo 2º, aponta que não constará no registro o nome da parturiente, informado apenas na declaração de nascido vivo.
É bom dizer que os termos assinados e regras infralegais relativas ao tema deixam claro que a mulher que cederá o útero para a implantação do material genético não vai ter quaisquer direitos sobre o embrião, o nascituro e ou o bebê. Assim, não há que se falar em qualquer direito de filiação ou mesmo direitos sobre guarda, visita, pensão alimentícia ou direitos sucessórios (relacionado a heranças), por exemplo.
De outro lado, o casal que cedeu o material genético para a fertilização têm todos os direitos e deveres advindos do Direito de Família e de Sucessões.
A barriga de aluguel em outros países
Diferentemente do que ocorre no Brasil, o procedimento de alugar o útero para a gestação de um bebê é permitido em países como Estados Unidos, Índia, Tailândia, Ucrânia, México etc. No caso norte-americano, personalidades já utilizaram o método. Entre elas estão a socialite Kim Kardashian e o rapper Kanye West, que optaram pela barriga de aluguel para a gestação de seu terceiro filho.
De acordo com o site TMZ, especializado na cobertura da vida de famosos, eles teriam pago o equivalente a R$ 350 mil à responsável por ceder o útero até o nascimento.
Nada impede que um brasileiro vá até um desses países para realizar procedimento semelhante, como fizeram Paulo Gustavo e Thales Bretas, para driblar as restrições de dispositivos que suprem a inexistência de uma lei sobre barriga de aluguel no Brasil.
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